Greve histórica dos trabalhadores em educação de Belo Horizonte

O auge dessa luta foi a assembleia do dia primeiro de julho com mais de 4.500 trabalhadores, que fecharam a Av. Afonso Pena em frente à Prefeitura.

25 de Julho de 2025 às 15h00

Assembleia dos Trabalhadores da Educação fecha Av. Afonso Pena, em frente à Prefeitura de Belo Horizonte. Foto: Jornal O Futuro.

Por Diego Miranda

A capital mineira presenciou a maior greve da educação das últimas décadas. Durante 29 dias, os trabalhadores da educação do município de Belo Horizonte demonstraram sua incontestável força na cidade, resistindo ao projeto de precarização e privatização da educação pública em curso. Mesmo sem conquistar o reajuste conforme o índice do piso nacional do magistério, derrotaram todas as tentativas do prefeito Álvaro Damião (União Brasil) de colocar a cidade contra os trabalhadores da educação.

Governo inimigo da educação

O ano de 2025 começou com uma grande greve dos trabalhadores da educação terceirizados pelo fim da escala 6x1 e redução da jornada de trabalho, que, em fevereiro, colocou 4 mil trabalhadores em marcha. Uma luta que pressionou a Prefeitura de Belo Horizonte e a Minas Gerais Administração e Serviços S.A. (MGS), responsável pelo contrato de terceirização, contra a constante precarização do trabalho na educação e desvalorização dos profissionais.

No início de abril, o ex-secretário de educação Bruno Barral (União Brasil) foi exonerado após operação da Polícia Federal. A Operação Overclean investiga um esquema bilionário de desvio de emendas parlamentares que deveriam ser destinadas a obras de infraestrutura. O ex-secretário já havia firmado em Belo Horizonte inúmeros contratos suspeitos e alguns sem licitação, como o contrato de mais de R$13 milhões com a empresa Falconi Consultores S.A., especializada em privatização de estatais. O ano iniciou sem uniforme e livros didáticos para os estudantes, enquanto o ex-secretário comprou, por fora do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), quase 100 milhões de livros paradidáticos de péssima qualidade.

O Sindicato dos trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-REDE/BH) iniciou uma importante campanha, cobrando da prefeitura: “Cadê o dinheiro da educação?”, conforme vídeo nas redes sociais da entidade. Essa campanha foi o fio condutor das denúncias sobre o orçamento da educação municipal, visto que Belo Horizonte é a 4ª cidade que mais arrecada impostos no país. A ação desmascarou o governo, revelando sua opção política por não investir na educação pública e nos seus trabalhadores.

2,49% não é valorização

Os trabalhadores haviam aprovado na assembleia de 13 de março sua pauta de reivindicações, mas o governo se manteve intransigente dizendo que só apresentaria sua proposta aos servidores no dia 30 de maio. Nesse período, o conjunto dos servidores exigiam negociação já. Entretanto, o governo só apresentou sua proposta de 2,49% para todo funcionalismo na data já estabelecida. O Sind-REDE/BH foi protagonista em questionar o valor do índice salarial, enquanto os demais sindicatos de servidores não se empenharam nesse enfrentamento.

Em um cenário onde a Prefeitura arrecada cada vez mais, mas transfere esses recursos para contratos e terceirizações enquanto sofre investigações e faltam condições materiais básicas  para o trabalho nas escolas, um índice tão irrisório foi como jogar fogo no palheiro. O índice de 2,49% representou numericamente o sentimento de desvalorização de todos os trabalhadores da educação e foi o grande motor da mobilização. Em uma assembleia com mais de 2 mil trabalhadores, a greve foi deflagrada com um índice de mais de 80% de turmas paralisadas na rede municipal de Belo Horizonte.

O prefeito Álvaro Damião (União Brasil) optou por deixar a cidade com uma greve em curso para ir até Israel para participar de um lobby sionista de segurança pública. O que acabou coincidindo com o conflito entre Israel e Irã, forçando que ele ficasse em um bunker durante os bombardeios. Isso demonstrou quão ridícula foi a opção do prefeito de sair da cidade durante a greve e se aliar a um estado que oprime e massacra o povo palestino.

A luta coletiva e organizada conquista

A força dos trabalhadores favoreceu uma grande cobertura da mídia, se colocando em alguns casos de forma favorável ao movimento. O apoio e mobilização das famílias e das comunidades escolares em todas postagens nas redes sociais foi fato notório. Em um cenário onde a judicialização tem sido usada para limitar o direito de greve, a tentativa da prefeitura de impedir o movimento por meio do judiciário foi derrotada pela força da categoria.

Essas conquistas foram construídas em cada ato e atividade, com ampla participação da base. Os trabalhadores realizaram um Arraiá para denunciar a desvalorização salarial e o uso indevido do dinheiro da educação pública. Realizaram uma recepção do prefeito no Aeroporto, exigindo negociações. Fizeram campanha de doação de sangue durante o Junho Vermelho. Recolheram e distribuíram alimentos para as famílias em vulnerabilidade social. Entre várias outras ações que demonstraram o compromisso com a cidade. O auge dessa luta foi a Assembleia do dia primeiro de julho com mais de 4.500 trabalhadores, que fecharam a Av. Afonso Pena em frente à Prefeitura.

Com toda luta coletiva da categoria foi possível ter avanços e conquistas importantes: duas novas progressões por escolaridade, em um cenário de destruição de carreiras; ampliação de tempo para 8 horas das reuniões pedagógicas mensais; reconhecimento de dívida inflacionária, desde 2017, de 2,4%, que será pago em março de 2026, retroativo a janeiro; vale refeição proporcional à jornada para todos os servidores. Um dos pontos sensíveis é a exclusão dos professores e professoras aposentadas, que conseguiram avançar com o reconhecimento da Prefeitura sobre suas perdas.

O índice de 2,49% foi o único ponto inalterado. O fato dos demais sindicatos de servidores municipais terem aceitado a proposta do governo sem qualquer forma de luta e enfrentamento colocou os trabalhadores da educação em isolamento. Além da política de austeridade adotada pelo governo, que impõe a todos os servidores o mesmo reajuste, sendo que a educação tem verbas próprias e uma política de valorização e índice anual. Tanto no cenário das verbas federais, quanto da arrecadação municipal, fica claro que a opção da prefeitura é pela austeridade fiscal e a desvalorização dos trabalhadores da educação.

A greve pode não ter conquistado um melhor índice de reajuste salarial, considerando todas as perdas históricas, mas demonstrou avanço político-organizativo dos trabalhadores para outras lutas que virão e exigirão resistência e força. A maior conquista de uma greve é o avanço na consciência e organização dos trabalhadores, em especial, no cenário de austeridade fiscal, precarização do trabalho e privatizações. A greve da educação foi exemplo nacional de resistência e força, demonstrando porque essa é uma rede que não se rende.