ALMG dá um passo na privatização da Copasa e PEC do Cala a Boca segue para 2° turno de votação
Em assembleia anterior à votação da PEC, os trabalhadores da Copasa e da Copanor deliberaram pela realização de uma greve dos dias 21 a 23. O movimento contou com mobilizações ao redor do estado e manifestações massivas em Belo Horizonte.

Trabalhadores da Copasa e Copanor em greve dão às costas durante a fala do presidente-diretor da empresa em Audiência Pública na ALMG. Foto: Jornal O Futuro.
Na madrugada da última sexta-feira (24), a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou em 1° turno a PEC 24/2023, a PEC do Cala a Boca, que retira da constituição estadual a obrigatoriedade de referendo popular para que ocorra a privatização da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). A PEC ainda precisa passar por uma Comissão Especial e ser votada em 2° turno no plenário da ALMG, mas sua aprovação já é uma vitória do Governo Zema, que desde o início de seu governo defende a entrega dos bens públicos aos empresários.
Em assembleia anterior à votação da PEC, os trabalhadores da Copasa e da Copanor deliberaram pela realização de uma greve dos dias 21 a 23. O movimento contou com mobilizações ao redor do estado e manifestações massivas em Belo Horizonte. Após a votação, os trabalhadores suspenderam a greve, mas devem retomar a paralisação nesta terça-feira (28), com a perspectiva de manutenção da greve até a votação em 2° turno. Na segunda-feira (27), sindicatos, movimentos sociais e partidos de esquerda se reuniram na sede da CUT Minas em uma plenária convocada pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Minas Gerais (Sindágua-MG), que definiu uma agenda de lutas durante a semana até a votação em 2º turno, com a convocação de um ato em Belo Horizonte para o domingo, 2 de novembro, na Praça Raul Soares às 9:00.
Em entrevista ao jornal O Futuro, o presidente do Sindágua-MG, Eduardo Pereira, avaliou positivamente a adesão dos trabalhadores às manifestações: “Nós fizemos 3 grandes passeatas nos dias 21, 22 e 23. No dia 21 a gente conseguiu colocar mais de 2 mil trabalhadores na rua. No dia 22, como teve a participação do interior, teve mais de 6 mil trabalhadores, e a gente sabe porque a gente tem que fazer o levantamento dos ônibus, tem que pagar a alimentação, então esse cálculo é real. E no terceiro dia, que foi o dia da votação, nós conseguimos nos manter mobilizados com mais de 2 mil trabalhadores na ALMG”.
Romeu Zema tem defendido a entrega das estatais mineiras desde o início de seu governo. Apesar de também buscar a privatização da Cemig e da Codemig, a tática adotada nesse momento foi de não avançar sobre todas as empresas de uma vez, tentando garantir primeiro a entrega do serviço de saneamento para o mercado financeiro. A ideia é dividir os trabalhadores e reduzir a resistência. Eduardo avalia que isso não enfraqueceu a unidade entre as categorias: “Tirando a Cemig, o cenário não ficou fácil. O cenário ficou ainda mais difícil, porque nós criamos mobilizações estratégicas, conversamos com a categoria, em uma perspectiva de que a Cemig está com a gente, os professores tão com a gente, os sindicatos parceiros tão com a gente, e a população precisa entender o que tá acontecendo”.
Para ele, a força da movimentação do governo reside no desconhecimento da pauta, apontando para uma pesquisa recente da Itatiaia/Instituto Ver que indica que 85% da população de Minas Gerais desconhece a proposta de extinção do referendo. Quando perguntados, 66% dos respondentes defenderam a manutenção do referendo. 44% é contra a privatização, enquanto 36% é favorável. Frente à impopularidade da pauta, o governo busca garantir a entrega da Copasa ainda em 2025, evitando que esse tema se estenda em ano eleitoral.
A privatização da Copasa não é um caso isolado. A Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto indica que entre 2019 e 2025 houve um aumento de 525% no número de municípios que adotaram algum tipo de privatização no saneamento, seja na forma de PPPs, concessões parciais ou totais. Até agosto de 2025, 32,7% dos municípios haviam privatizado o saneamento.
Eduardo Pereira aponta que os resultados desse avanço das privatizações são a precarização e o encarecimento das tarifas: “Em MG nós temos aqui Ouro Preto, que foi privatizado. Lá nunca foi Copasa, era um departamento municipal. Privatizou e os clientes tiveram um reajuste de 200% na tarifa. Foi tão danoso que o prefeito que idealizou esse projeto não conseguiu reeleição. Os vereadores que apoiaram o prefeito, muitos deles não conseguiram reeleição. Exemplos fora de Minas: Manaus foi privatizado no ano 2000, com as mesmas promessas que o governo Zema está fazendo agora, e Manaus hoje é a pior cidade entre as maiores cidades do país em termos de saneamento básico. [Em Cochabamba, na Bolívia,] quando privatizou o saneamento também teve aumento de tarifa, precarização do serviço. Gerou uma revolta na população porque a população tinha que se comprometer em 25% da sua renda pra ter acesso à água, e que chegou a ter uma discussão, que gerou um livro, que chama Guerra da Água”.
O líder sindical também destaca o caráter social da Copasa enquanto empresa pública: “[Minas Gerais] é o estado com o maior número de municípios, e com diversas desigualdades. Por exemplo, eu estou na região do Norte de Minas, na cidade de Salinas. A nossa região tem uma semelhança muito grande com o nordeste do país. É uma região onde você não vê muita infraestrutura, políticas públicas como tem aqui na região mais rica do nosso estado, em Belo Horizonte. Então a Copasa é a única política pública que a população carente daquela região tem de forma igual à região mais rica porque ela usa o subsídio cruzado, que nada mais é que a Copasa pegar [a arrecadação das] cidades maiores, por exemplo aqui da capital mineira que representa 27% da arrecadação da Copasa, pra investir em cidades menores, como Berilo, Assis Badaró, Montezuma, aquela região do Norte de Minas”.
O presidente do Sindágua-MG colocou aquilo que considera ser a tarefa atual do movimento: “Nosso papel agora, junto com os trabalhadores, movimentos sociais, movimentos sindicais, é fazer com que esses deputados sejam vistos na ponta, fazer com que o voto desses deputados seja visto na ponta. E mostrar, tentar fazer uma relação, muito criativa, de que o voto do deputado vai afetar a conta do consumidor, o voto do deputado vai fazer com que aconteça naquela região o que aconteceu em Ouro Preto, o que aconteceu em Manaus, e que pode vir uma futura guerra como aconteceu em Cochabamba”.