Brasil e EUA realizarão exercícios militares na caatinga brasileira em meio a tarifaço de Trump
Entre 1º e 14 de novembro de 2025, o Brasil sediará exercícios militares conjuntos com os EUA em Pernambuco. Realizada em meio a tensões comerciais, operação expõe vulnerabilidades estratégicas do país ao permitir que tropas estrangeiras conheçam o território nacional

Reprodução/Foto: Exército Brasileiro.
Entre os dias 1º e 14 de novembro de 2025, está prevista a realização de exercícios militares conjuntos entre o Exército Brasileiro e as Forças Armadas dos Estados Unidos em Pernambuco. As atividades ocorrerão no 72º Batalhão de Infantaria da Caatinga, em Petrolina, e no Campo de Instrução Fazenda Tanque do Ferro, em Lagoa Grande. Até 300 militares dos EUA devem desembarcar no Brasil para o treinamento, que ficará sob a coordenação do Comando Militar do Nordeste (CMNE).
A preparação para a operação ocorre em meio ao agravamento das tensões comerciais entre os dois países, após o governo dos EUA, liderado pelo presidente Donald Trump, impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, medida que incide diretamente sobre cerca de 50,7% da pauta exportadora brasileira destinada aos Estados Unidos.
O exercício conjunto, batizado de CORE 25 (Combined Operation and Rotation Exercise), é fruto de acordos firmados na XXXVI Conferência Bilateral de Estado-Maior (CBEM), realizada no Texas em outubro de 2020, ainda durante o governo Bolsonaro. Desde então, manobras similares já foram promovidas em São Paulo, em 2021, e nos Estados do Pará e Amapá, em 2023. O cronograma prevê a continuidade dos treinamentos anuais, alternadamente em cada país, até 2028.
Os exercícios refletem o aprofundamento da cooperação entre os exércitos brasileiro e estadunidense, mas também evidenciam a relação assimétrica entre as forças. A dependência tecnológica do Brasil é expressiva: radares, sistemas de comunicação criptografada, caças, embarcações e até munições fundamentais para a defesa nacional dependem de suporte dos EUA. Estimativas indicam que mais de 60% da base tecnológica das Forças Armadas brasileiras está atrelada a componentes e softwares sob jurisdição direta da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), comandada por Washington.
Essa dependência se traduz também em subordinação política. Em entrevista ao Diário de Pernambuco, o comandante do Comando Militar do Nordeste, general Maurílio Miranda Netto Ribeiro, revelou o papel do Exército Brasileiro como facilitador na transmissão de informações estratégicas às tropas estrangeiras, ao afirmar:
“A operação na caatinga, por sua vez, representa uma oportunidade ímpar para que os militares americanos se familiarizem com as condições desafiadoras desse bioma, conhecido por seu clima árido e vegetação específica e que corresponde aproximadamente a 80% da área da jurisdição do Comando Militar do Nordeste”
A realização da operação contrasta com o discurso oficial de soberania do governo federal. Enquanto o Brasil enfrenta ataques tarifários que pressionam sua economia, o Exército permite que tropas estrangeiras se familiarizem com o território nacional — conhecimento considerado decisivo em qualquer conflito militar.
As tarifas impostas pelos Estados Unidos funcionam como instrumento de pressão intervencionista, com objetivos estratégicos que vão desde favorecer empresas de capital estadunidense no desmantelamento do Pix até garantir vantagens na exploração de minerais críticos e terras raras. Nesse contexto, se a ofensiva econômica evoluir para uma intervenção de caráter militar, os exercícios conjuntos expõem o Brasil à vulnerabilidade significativa. Especialistas alertam que, em cenários de guerra, o domínio do território é crucial, e, ao permitir que tropas estrangeiras conheçam o terreno nacional, o Exército brasileiro entrega justamente a chave que sustenta qualquer estratégia de defesa.
O episódio expõe ainda o descompasso entre o Executivo e as Forças Armadas. Apesar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar que o Brasil não abrirá mão de sua soberania diante das tarifas, a continuidade dos exercícios com os EUA reforça a percepção de autonomia das Forças Armadas frente ao governo civil.
Segundo os militares, um rompimento nas relações com os Estados Unidos seria inviável, pois provocaria um colapso na manutenção e no funcionamento dos equipamentos de Defesa. Argumentam que a substituição da parceria não é factível, já que outros fornecedores internacionais também recorrem à tecnologia de origem estadunidense e, sobretudo, devido ao programa FMS (Foreign Military Sales). Esse mecanismo permite a compra de equipamentos militares de segunda linha a preços reduzidos — por meio dele, o Brasil adquiriu helicópteros Black Hawk, peças de veículos e sistemas de mísseis.
Escudadas nessa dependência tecnológica, as Forças Armadas pressionam o governo a fazer um acordo e a abandonar o que chamam de ponto de vista “ideológico”, ainda que tal posição contrarie os interesses nacionais. Nem os militares nem o Executivo, contudo, apresentam qualquer proposta concreta de diversificação de parcerias comerciais ou de um plano de investimentos capaz de reduzir a dependência tecnológica brasileira.
Até o momento, o governo brasileiro não reagiu de forma proporcional às medidas de Washington. Não houve aplicação de tarifas recíprocas, tampouco adoção de iniciativas estruturais, como a revisão da Lei de Patentes — que poderia fortalecer a indústria farmacêutica nacional — ou a flexibilização do arcabouço fiscal, que restringe investimentos públicos em áreas estratégicas.
Nesse cenário, a autorização para a realização da CORE 25, que depende exclusivamente de decreto presidencial, reforça a avaliação de que a reação do governo ao tarifaço e à ingerência estrangeira em assuntos internos permanece restrita ao campo retórico. A suspensão das manobras representaria um gesto efetivo de defesa dos interesses nacionais diante das agressões imperialistas, mas, até o momento, não há sinais de que essa medida esteja sendo considerada pelo Palácio do Planalto.