Movimentos realizam ato no RJ contra “Gratificação Faroeste” e Governador anuncia veto
O ato, realizado como resposta à aprovação da “Gratificação Faroeste” pela ALERJ, parou o trânsito em direção ao Palácio Guanabara. Após pressão das ruas, intensificada por questionamentos da Defensoria Pública, MPF e STF, Castro anunciou recuo.

Foto: Jornal O Futuro.
Por Gustavo Pedro
Em resposta à aprovação do retorno da “Gratificação Faroeste” pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), um conjunto de movimentos de familiares de vítimas da violência do Estado, de juventudes e de partidos políticos realizou, no dia 14 de outubro, uma marcha em direção ao Palácio da Guanabara.
Entre as principais demandas do ato, estava destacada a necessidade de revogação imediata da bonificação por mortes que foi aprovada para policiais civis no Estado. A nova “gratificação faroeste” estabelecia o pagamento de um bônus que poderia variar de 10% a 150% sobre os vencimentos dos agentes de segurança.
Buscando responder às críticas levantadas pelos movimentos populares e partidos de esquerda e do campo progressista, deputados da base do Governo de Cláudio Castro (PL) passaram a se movimentar na ALERJ, visando garantir uma extensão das gratificações também aos policiais militares. Sem aceitar recuos, a tática da extrema-direita no parlamento fluminense seguia a linha de “dobrar a aposta”.
Contudo, em entrevista concedida no dia 20 de outubro, Cláudio Castro anunciou, após sofrer pressões em diversos níveis – que vinham das ruas, de especialistas em segurança pública e do judiciário –, que vetará a proposta.
A pressão das ruas
A concentração do ato de 14 de outubro foi organizada no Largo do Machado, no bairro do Catete, e foi marcada pela leitura do Manifesto das vítimas da política genocida de Cláudio Castro: Chega de sangue!, construído e impulsionado por dezenas de organizações políticas, parlamentares, entidades estudantis e coletivos de luta antirracista.
Não se atendo apenas à luta contra o retorno da política de gratificação por mortes que havia, entre os anos de 1995 e 1998, dobrado a média de mortes mensais em ações policiais no Estado, a leitura do manifesto e as falas dos representantes das organizações buscaram denunciar a política de extermínio vigente nas periferias e favelas do Rio de Janeiro. Palavras de ordem pautando o fim das chacinas e da polícia militar eram repetidas ao final de cada uma das intervenções que denunciavam a letalidade policial contra jovens negros.
Foram relembrados os casos das execuções, perpetradas por agentes do Estado, de jovens como: Kathlen Romeu, que estava grávida, aos 24 anos, quando foi morta pela PM no Complexo do Lins enquanto passeava com a avó; Thiago Menezes, de 13 anos, que foi executado enquanto estava caído no chão, após ser baleado na perna durante manifestação na Cidade de Deus; João Pedro, morto dentro da casa de seu tio, no Salgueiro, em São Gonçalo, aos 14 anos; e Ágatha Félix, morta aos 8 anos, dentro de uma Kombi, durante operação da polícia militar no Complexo do Alemão.
Ganhou destaque, entre as diversas falas, o caso de Herus Guimarães, jovem morto a tiros pelo BOPE em meio a operação policial que invadiu uma festa junina no morro Santo Amaro, no Catete, mesmo bairro onde se concentrava o ato. O depoimento de sua tia, realizado no dia seguinte à data em que o jovem completaria 25 anos, buscava relembrar que a favela é lugar de gente trabalhadora e que essa guerra seguia destruindo famílias como a dela, emocionando a todos os presentes.
Após a intervenção da familiar de Herus, na última fala realizada no momento de concentração do ato, foram entoadas por todos os presentes as palavras de ordem “Chega de matança, o Cláudio Castro é assassino de criança!” e “Marielle perguntou, eu também vou perguntar! Quantos mais tem que morrer pra essa guerra acabar?”.
Encerrado o momento da concentração, os manifestantes se posicionaram na via, fechando parcialmente o trânsito, para seguirem em marcha pela rua lateral ao Largo do Machado até o Palácio Guanabara, sede oficial do Governo do Rio de Janeiro. A PMERJ realizou um cerco ao Palácio, visando defender seu comandante de quaisquer questionamentos sobre sua política de fortalecimento da máquina de guerra do Estado contra os trabalhadores moradores de favelas e periferias. O ato foi encerrado às 19 horas, em frente à sede do governo.
Questionamentos no judiciário e o recuo de Castro
Apesar da circulação de rumores, em meio a parlamentares, sobre uma suposta intenção de Cláudio Castro em vetar a proposta, aprovada em 23 de setembro na ALERJ, o Governo do Estado demorou praticamente um mês até apresentar uma posição sobre o tema. O período de silêncio vinha sendo utilizado como elemento para avaliar a reação pública ao tema.
Enquanto isso, se acumulavam os posicionamentos contrários à gratificação emitidos pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Ministério Público Federal e diversos juristas ouvidos por jornais da imprensa burguesa e da imprensa popular. O STF, no dia 16 de outubro, também cobrou explicações sobre a medida, no âmbito do processo da ADPF Favelas.
A denúncia da inconstitucionalidade da medida, para além do agravamento da política de extermínio já vigente, seguiu ganhando tração no debate público desde a sua aprovação na ALERJ. O anúncio do veto por Cláudio Castro, que atinge a proposição de sua própria base aliada, buscou direcionar suas críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) que, recentemente, havia considerado inconstitucional uma gratificação concedida, através de emendas parlamentares, aos policiais penais no Estado
Tendo perdido a batalha da opinião pública – e avaliando que restavam poucas margens para uma reversão que auxiliasse em disputas judiciais contra tribunais superiores, como a extrema-direita vem fazendo de forma recorrente no país –, restou ao Governador apenas o recuo envergonhado.