SP e MG reajustam bolsas de pesquisa enquanto bolsas federais permanecem estagnadas

Diante dos limites impostos pelo Novo Teto de Gastos, que inviabiliza reajuste anual das bolsas de pesquisa da CAPES e do CNPq, a ANPG convoca mobilizações para dia 12 de agosto por reajustes, ampliação das bolsas e direitos previdenciários para pós-graduandos.

11 de Agosto de 2025 às 21h00

Reprodução/Foto: Divulgação/Governo de São Paulo.

Por Davi Bessa

Diante dos limites impostos pelo Novo Teto de Gastos, que inviabiliza reajuste anual das bolsas de pesquisa da CAPES e do CNPq, a ANPG convoca mobilizações para dia 12 de agosto por reajustes, ampliação das bolsas e direitos previdenciários para pós-graduandos.

Os pesquisadores de São Paulo e de Minas Gerais podem comemorar: a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) anunciaram que os valores das bolsas serão reajustados a partir de 1º de agosto de 2025. Com a correção, por volta de 4,5%, a bolsa de mestrado FAPESP passará a ser de R$3.270,00 no primeiro ano de bolsa (MS-I) e R$3.450,00 no período restante (MS-2),enquanto a da FAPEMIG atingirá o valor de R$3.000,00.A bolsa FAPESP nos primeiros dois anos de doutorado (DR-I) atingirá R$5.790,00, e atingirá R$7.140,00 os anos subsequentes (DR-2). Já na agência mineira um bolsista de doutorado receberá R$4.500,00.

É o terceiro reajuste das agências estaduais desde 2023, e beneficia os mais de 10 mil bolsistas das agências estaduais, buscando repor as perdas inflacionárias do último ano. Enquanto isso, a realidade para os bolsistas das agências federais, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), é de estagnação. O último reajuste ocorreu em 2023, elevando as bolsas de mestrado de R$1.500,00 para R$2.100,00 e as de doutorado de R$2.200,00 para R$3.100,00. Esse aumento veio após uma década sem qualquer correção, cobrindo apenas 40% das perdas inflacionárias acumuladas desde 2013, quando teria sido necessário um reajuste de 70% para recompor o poder de compra. A ausência de novas correções nos últimos dois anos, apesar da mobilização de pós-graduandos, agrava a situação.

Valores das bolsas de pós-graduação na CAPES e no CNPq de 1995 a 2025 - valores nominais e valores corrigidos pelo IPCA acumulado de julho do ano do eixo horizontal a junho de 2025.

Quando criadas,em 1995, as bolsas de mestrado pagavam R$724,00. Corrigindo pelo IPCA,a mesma bolsa deveria pagar R$4.642,63 em julho de 2025. Ou seja, para recompor o poder de compra, seria necessário um reajuste de 121% para as bolsas de mestrado da CAPES, e bolsas FAPESP precisariam de um aumento de 42% para atingir este mesmo patamar. A falta de reajustes anuais e políticas constantes de corte de gastos têm feito cientistas acumularem 30 anos de perdas remuneratórias.

Independentemente da vontade dos presidentes da CAPES e do CNPq, sem recomposição orçamentária e ampliação nos investimentos em ciência e tecnologia é impossível que as agências consigam realizar o reajuste anual das bolsas. O Novo Teto de Gastos de Haddad inviabiliza a ampliação nos investimentos, e a redução orçamentária vem sendo utilizada para que o governo satisfaça a meta de superávit primário.

Entre 2024 e 2025 o orçamento do CNPq teve uma queda de 7,45% e a CAPES, que já tinha tido uma queda de 400 milhões no orçamento de 2023 para 2024, teve outra redução de 300 milhões para 2025. Já o orçamento FAPESP aumentou 17,6% de 2024 para 2025 (indo de 2,37 bilhões de reais para 2,79 bilhões de reais), o que dá provisões orçamentárias para um reajuste anual, possível graças às garantias orçamentárias.

A Constituição do Estado de São Paulo no seu artigo 271 e a Constituição do Estado de Minas Gerais no seu artigo 212 garantem que pelo menos 1% das receitas tributárias de São Paulo e de Minas Gerais devem ser obrigatoriamente destinados ao financiamento da FAPESP e da FAPEMIG, respectivamente. Essa garantia orçamentária constitucional permite que a agência consiga ampliar o financiamento de pesquisas e reajustar as bolsas ano a ano, independente da meta fiscal do governo vigente. No entanto, em se tratando de receitas tributárias, trata-se de uma garantia sujeita a volatilidade em caso de redução na arrecadação; além do problema do caráter regressivo da política tributária em questão. No caso da CAPES e do CNPq, não há previsão orçamentária mínima garantida constitucionalmente, e cabe brigas para se conseguir o mínimo na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA) da União.

Mesmo que fosse criado um piso constitucional para o desenvolvimento científico, como já existe para saúde e educação, o Novo Teto de Gastos ainda atravancaria o reajuste anual das bolsas. Isso porque o novo regime fiscal limita o crescimento real das despesas primárias a, no máximo, 2,5% ao ano, mesmo que a arrecadação cresça muito mais. Como os pisos são vinculados à receita, em anos de alta arrecadação, o valor mínimo a ser investido em ciência poderia crescer acima do teto permitido para o conjunto das despesas. Isso criaria um conflito: ou o governo descumpre o teto (lei complementar), ou descumpre o piso (constitucional). Embora o piso seja juridicamente superior, o governo tem priorizado o cumprimento do teto, o que o obriga a cortar despesas em outras áreas – como bolsas e fomento – para acomodar os pisos constitucionais sem violar a regra fiscal. Esse cenário de escolhas difíceis é o que tem impactado os orçamentos da Saúde e da Educação, mesmo com seus pisos garantidos. Ou seja, mesmo com um piso, sem espaço fiscal real devido ao Novo Teto de Gastos, o reajuste anual das bolsas continuaria sendo inviável.

A Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) está convocando uma paralisação nacional da pós-graduação para o dia 12 de agosto com as bandeiras: Por reajuste, bolsas pra geral e direitos previdenciários. As pautas do ato são tocadas na perspectiva daCesta de Direitos Básicos, proposta da ANPG inaugurada em Julho de 2023 com a publicação do Dossiê Florestan Fernandes. Nesse sentido, lê-se “direitos previdenciários” como “garantia que o tempo de formação de mestres e doutores seja computado como tempo de serviço, a menos que o(a) pós-graduando(a) já seja segurado(a) do INSS”.

A proposta da ANPG, sistematizada no Dossiê, parte da análise de que o caráter híbrido de estudante-trabalhador do pós-graduando é explicado pelo caráter do pós-graduando de pesquisador por consequência, que realiza atividades de pesquisa inerentes ao processo formativo. Daí, o que o pós-graduando não realizaria trabalho de pesquisa por excelênciae não precisaria de direitos trabalhistas, mas de direitos do pós-graduando, como direito à licença paternidade, possibilidade de afastamento médico remunerado, adicional de insalubridade e outros direitos paralelos a direitos trabalhistas conquistados por trabalhadores ao longo de séculos de luta.Direitos trabalhistas com outro nome – e com menos garantias.

Além dos valores das bolsas que precisam ser reajustados, a falta de bolsas e a ausência de direitos trabalhistas são questões centrais para a vida do pós-graduando. Para conquistar tais avanços, é necessário aumento significativo na verba do CNPq e da CAPES. Fora a ausência de garantias orçamentárias, o atual regime fiscal impõe um teto rígido ao crescimento das despesas públicas, o que torna inviável a recomposição orçamentária necessária para garantir reajustes anuais, ampliação do número de bolsas e inclusão previdenciária. A ANPG, nos chamados e em sua política, ignora o contexto do teto de gastos.

A paralisação irá contar com caravanas da ANPG saindo dos estados para um ato no dia 12 de agosto em Brasília, e pós-graduandos interessados podem se inscrever no formulário da ANPG.