Agronegócio manobra para esvaziar Plano Clima e manter Brasil como maior poluidor

O chamado Plano Clima, roteiro elaborado para analisar e colocar em prática medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, vem sendo alvo do agronegócio por suas pretensões em relação à descarbonização da economia.

25 de Outubro de 2025 às 21h00

Reprodução/Foto: Brasil de Fato.

Por Guilherme Sá

Com a aproximação da COP 30, que ocorrerá já na primeira quinzena de novembro em Belém do Pará, os representantes do agronegócio seguem agindo para que seus lucros se mantenham intactos frente às políticas voltadas à redução da emissão de gases efetuadas pelo governo federal.

Na mais recente manobra, o chamado Plano Clima, roteiro elaborado para analisar e colocar em prática medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, vem sendo alvo do agronegócio por suas pretensões em relação à descarbonização da economia.

De acordo com o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), o agronegócio brasileiro perde apenas para México, EUA e Canadá nas Américas quando o assunto é emissão de gases. Tanto o metano, fruto do processo digestivo das mais de 238 milhões de cabeças de gado brasileiras, quanto o óxido nitroso (N₂O), advindo do uso de fertilizantes nitrogenados, atribuem ao agro a maior responsabilidade pela degradação climática, fazendo, portanto, recair sobre ele a responsabilidade pelo reequilíbrio da balança. Sem contar que o setor está relacionado com a perda vegetal, que é um dos principais fatores para as mudanças do clima.

No entanto, longe de aceitar passivamente as metas nacionais de redução pretendidas pelo Plano Clima, representantes do agro buscam manobrar para que as propriedades privadas sejam incluídas nas “remoções antrópicas”, noção aplicada para terras indígenas e florestas preservadas. Considerando que estes locais já realizam um trabalho de redução da emissão de gases, o governo brasileiro entende que não há o que cobrar deles.

Assim, o agronegócio busca que as Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reservas Legais (RLs) em suas propriedades sejam incluídas nessa zona de “isenção”, desconsiderando que já são áreas protegidas pelo Código Florestal e, portanto, não são zonas adicionais que estão sendo protegidas, e sim zonas que já devem ser protegidas por lei. Isso impede que sejam incluídas nas metas do Plano Clima, pois a descarbonização só conta pelo que é feito a mais, não pelo que já é obrigação jurídica.

Censo Agropecuário. Reprodução: IBGE.

Em carta enviada ao secretário nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Aloisio Melo, o Observatório do Clima denunciou a tentativa do agronegócio de driblar as metas do Plano Clima, abordando ainda sua insuficiência como programa de descarbonização.

Nesse contexto, enquanto o governo federal tenta, através do discurso midiático, apontar uma suposta luta tenaz contra a crise climática, a realidade escancara as contradições econômicas do Brasil nas disputas do agronegócio em torno da COP.

Maior produtora de proteína animal do mundo, a empresa JBS vem atuando significativamente para que qualquer medida que venha a ser adotada na conferência seja flexibilizada, a fim de evitar prejuízos às exportações e aos negócios da empresa.

Movimentando mais de US$ 12,9 bilhões, a empresa busca projetar uma imagem de exemplo de sustentabilidade na redução de emissões de gases e em outras atividades alinhadas ao Plano Clima. Por trás da encenação, contudo, a empresa opera em locais autuados pelo IBAMA por desmatamento ilegal e com déficits de Reserva Legal, ironicamente na região entre Marabá e Santana do Araguaia, no Pará, estado que sediará a COP.

Fazenda Nova Orleans, propriedade da JBS que foi alvo do IBAMA duas vezes. Reprodução/Foto: Intercept Brasil.

Em outra frente do lobby organizado pelo agronegócio, a Embrapa busca implementar o sistema de métricas GWP (Global Warming Potential Star), que, por meio de manobras técnicas, classifica os rebanhos brasileiros como emissores "neutros", isentando-os da necessidade de reduzir as emissões, mesmo quando estas já se encontram em níveis alarmantes.

Seus idealizadores e diversas instituições vinculadas à métrica GW* recebem financiamento da indústria pecuária, em redes que incluem até mesmo a JBS. Sua presença na COP 30 indica não apenas uma tentativa de mitigar prejuízos econômicos, mas de reverter qualquer medida que possa causar impacto real na degradação ambiental.

É nesses termos que a COP 30 se consolida não como solução, mas como parte do problema da crise climática. Enquanto o evento promove a ilusão de um “capitalismo verde”, a realidade expõe seu caráter de vitrine para os interesses do agronegócio, das petroleiras e do capital financeiro internacional.

O Plano Clima, nesse contexto, torna-se mais um instrumento de maquiagem contábil - seja pela adoção de métricas questionáveis como a GWP para ocultar as emissões do setor pecuário, seja pela aceitação de mecanismos de mercado como os créditos de carbono, que mercantilizam a natureza e violentam territórios tradicionais.

A experiência histórica demonstra que as COPs têm servido principalmente para consolidar novos mercados verdes que beneficiam os mesmos agentes responsáveis pela crise climática. A presença recorde de lobistas dos setores fóssil e do agronegócio em todas as edições não constitui uma contradição, mas revela a essência desses fóruns. A burguesia não financiará sua própria superação.