Com EAD e investimentos públicos, educação superior privada do Brasil é lucrativa para o mercado internacional

Segundo dados divulgados pela CNN Brasil, as matrículas EAD cresceram 326% na última década, sendo um aumento de 5,6% somente de 2022 para 2023, chegando a quase metade de todas as matrículas (49,25%).

29 de Junho de 2025 às 15h00

Por Filgueira

Segundo o Censo 2023 realizado pelo Ministério da Educação (MEC) e Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), 79,3% do total de matrículas (quase 8 milhões de estudantes) encontravam-se matriculados em instituições privadas de ensino superior. Segundo dados divulgados pela CNN Brasil, as matrículas EAD cresceram 326% na última década, sendo um aumento de 5,6% somente de 2022 para 2023, chegando a quase metade de todas as matrículas (49,25%).

Enquanto o arcabouço fiscal de Lula-Alckmin-Haddad prevê cortes de até R$ 42,3 bilhões nos próximos cinco anos na educação, segundo matéria do G1 e o Decreto nº 12.448 de Lula-Alckmin contingência em mais de 30% o orçamento das universidades e institutos federais brasileiros, o FIES terá um aumento de mais de 112 mil novas vagas somente em 2025 com um investimento feito pelo governo federal em mais de R$ 770 milhões para iniciativa privada e banqueiros lucrarem com o endividamento da classe trabalhadora; ao mesmo tempo, o PROUNI, teve uma redução de 67.984 vagas, forçando os estudantes a aderirem programas de financiamento, cursos EAD – mais baratos já que média de um curso superior a distância (EaD) no Brasil gira em torno de R$ 348 e as mensalidades de cursos presenciais de R$ 1.132 – ou abandonarem o sonho do ensino superior. Segundo levantamento realizado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNDA-IBGE) de 2023, dentro da população jovem e adulta (25 a 64 anos anos), apenas 21,3% tinham ensino superior completo

Segundo matéria da a Veja, 60% dos contratos firmados pelo FIES estão inadimplentes, e segundo artigo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) de 2022 cerca de 1,2 milhão de brasileiros que entraram no programa até o 2.º semestre de 2017 e estão com dívida atrasada há mais de 90 dias. Para garantir o lucro dos tubarões da educação e dos banqueiros, de acordo com cálculos do Tribunal de Contas da União (TCU), o governo federal arcou gastou mais de R$ 123 bilhões com FIES e PROUNI, somente entre 2013 e 2022. Além disso, com o programa ‘Desenrola Brasil’, o Governo Federal busca subsidiar dívidas a partir principalmente do Orçamento Geral da União e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para que os banqueiros e rentistas mantenham seus lucros.

Entre 1995 e 2015, segundo matéria da Revista Piauí, o número de instituições de ensino superior privado cresceu de 684 para 2069, enquanto as públicas saltaram de 210 para 295. Segundo artigo de Fernando Nogueira, cerca de 40% dos alunos estão matriculados em apenas cinco grupos educacionais, sendo eles: YDUQS (ex-Estácio), Kroton/Anhanguera (Cogna Educação), Laureate International Universities (ex-UNINASSAU), Adtalem Global Education (ex-Damásio, IBMEC) e Ser Educacional.

A maioria das ações desses grupos/instituições educacionais são negociadas na B3 – bolsa autorregulada sediada em São Paulo – ou na NASDAQ – EUA –, mas a composição acionária é amplamente internacionalizada com presença de fundos como Black Rock, Vanguard, JPMorgan, etc.

Tabela de principais conglomerados educacionais brasileiros. Reprodução: Outras Palavras (site).

Enquanto a União Nacional dos Estudantes (UNE) comemora como “vitória dos estudantes” o chamado “marco regulatório do EAD”, a realidade é que Lula apenas reduziu de 40% para 30% a permissão de ensino a distância em cursos presenciais e determinou que, mesmo na modalidade semipresencial, apenas 30% das atividades devem ser presenciais/físicas, e somente 20% precisam ser síncronas/mediadas; o que permite os conglomerados educacionais expandirem seus lucros a partir da precariedade do ensino ofertado e exploração de professores.

Aulas gravadas permitem que elas sejam reutilizadas, o que faz com que os profissionais da educação deixem de ser contratados para lecionar, promovendo a "uberização" da categoria e reduzindo o valor da hora/aula. O ensino a distância também permite salas superlotadas, fazendo com que um professor tenha que corrigir atividades, provas e prestar auxílio a mais estudantes do que faria na modalidade presencial - e ganhando menos do que ganharia nessa modalidade. Um estudo da UNIFESSPA constatou que a sobrecarga de trabalho, aliada à incerteza do emprego e à baixa remuneração, acarreta problemas como ansiedade, afeto negativo, estresse e burnout. Flexibiliza a relação de trabalho e dificulta a supervisão dos sindicatos, além da fiscalização dos órgãos trabalhistas.

Uma pesquisa do Diplomatique Brasil constatou que no EAD há uma redução de cerca de 33% do conteúdo padrão, e o material apresentado é exposto de forma rasa, superficial e introdutória em comparação ao ensino presencial. Como as aulas são reutilizadas por vários semestres, o curso perde atualizações e se torna datado, dificultando a integração do que o aluno está aprendendo com a realidade do mundo atual e o seu mercado de trabalho. Além disso, a pesquisa e a extensão são ameaçadas, e o estudante deixa de ter uma graduação que envolva a produção de conhecimento e o ensino prático, fundamentais para torná-lo um sujeito ativo na sociedade por meio da extensão.

Para o III Congresso Mundial Contra o Neoliberalismo na Educação, em novembro de 2024, a União da Juventude Comunista (UJC) e o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) declararam em nota como a educação superior tem “ocupado lugar central na agenda de privatização e mercantilização” com dois objetivos fundamentais: “em primeiro lugar, para isentar o Estado, como entidade pública, da responsabilidade direta sobre a educação da população; em segundo lugar, para inserir um projeto educacional moldado pelas demandas do mercado”.