Fundo Florestas Tropicais para Sempre: a nova espoliação da natureza

O Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) representa a financeirização da natureza em sua forma mais pura: um mecanismo que converte a floresta em commodity, transformando-a em ativo especulativo que circula nos mercados financeiros, enquanto apenas uma fração ínfima dos rendimentos é destinada, como esmola, a projetos de conservação.

27 de Outubro de 2025 às 15h00

Marina Silva em reunião com o comissário da União Europeia para o Clima, Wopke Hoekstra, em abril deste ano para falar sobre o TFFF. Reprodução/Foto: Rogério Cassimiro / Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima.

Por Lucas Ultracultura

O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), que será lançado durante a COP30 –  é uma criação do governo federal que propõe que governos e a iniciativa privada façam “pagamentos” a países que garantam a conservação de florestas por meio de “investimentos”. No total, mais de 70 países em desenvolvimento com florestas tropicais poderão receber recursos deste, que pode se tornar um dos maiores fundos multilaterais já criados no planeta.

Para Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima,  o Fundo “Não é doação, mas uma iniciativa que opera com lógica de mercado, alavancando recursos privados a partir de investimentos diversos”.

Essa iniciativa, liderada pelo governo brasileiro, vem sendo promovida desde a COP28, realizada em Dubai, em 2023, quando o tema foi abordado publicamente pela primeira vez pelo presidente Lula. Embora a ideia de que todos, especialmente os mais ricos, devem contribuir para a preservação do planeta pareça justa, a implementação desse esquema revela que a questão é bem mais complexa.

Além disso, ao contrário do que sugerem os discursos de Lula em fóruns internacionais, não se trata de uma imposição dos que possuem “os recursos” sobre os ricos que detêm o capital. Muito pelo contrário, o TFFF representa a financeirização da natureza em sua forma mais pura: um mecanismo que converte a floresta em commodity, transformando-a em ativo especulativo que circula nos mercados financeiros, enquanto apenas uma fração ínfima dos rendimentos é destinada, como esmola, a projetos de conservação.

Até o momento, além do Brasil, outros cinco países com florestas tropicais integram a iniciativa: Colômbia, Gana, República Democrática do Congo, Indonésia e Malásia. Participam também do processo de fundação do mecanismo cinco países potencialmente investidores: Alemanha, Emirados Árabes Unidos, França, Noruega e Reino Unido.

Esse é mais um exemplo de falsas soluções, dentro do “capitalismo verde”, se assemelha aos mesmos projetos apresentados nos Fóruns Pré-COP30, onde fica evidente que o lucro dos investidores se sobrepõe não apenas às necessidades ambientais, mas também subjuga biomas inteiros e comunidades, transformando-os em meros produtores de recursos e ‘produtos’ ainda com cara de “sustentáveis”.

E mesmo que existam projetos e iniciativas movidas pela boa vontade de pensar o futuro do meio ambiente e a autonomia dos habitantes do Brasil, os recursos serão destinados a ações selecionadas por um comitê técnico com participação do setor privado, responsável por decidir quais merecem financiamento. A pergunta que não quer calar é quais interesses realmente guiarão essas decisões.

Ainda que o TFFF seja apresentado como uma “inovação” e uma “nova forma de enxergar a conservação ambiental”, o que se observa é o aprofundamento da agenda neoliberal imposta pelo imperialismo e seguida com rigor pelo governo Lula. Por meio de políticas como o arcabouço fiscal, que sufoca cada vez mais o orçamento público, articula-se como solução que a iniciativa privada assuma o papel de salvadora e, ao mesmo tempo, de maior beneficiária dessa "resolução" da crise.

Enquanto isso, a soberania da classe trabalhadora brasileira e dos povos e comunidades que habitam o país torna-se cada vez mais ameaçada. Após a COP30, tende a ocorrer a consolidação dessa medida, já que, para entrar em operação, o fundo não precisa da concordância de todos os 196 países presentes no evento. Ele pode ser viabilizado apenas com o aporte inicial das nações investidoras e o trabalho dos países com florestas.

Além de o Brasil servir como laboratório dessa nova deturpação neoliberal da conservação ambiental, cabe ao governo atuar como garoto-propaganda e mediador junto a outros países de economias dependentes, sujeitos à exploração do Norte Global, incentivando a adesão a esses acordos. Eles incluem o próprio TFFF e também uma coalizão para o mercado de carbono, que submeterá todos os países envolvidos à criação de um limite global de emissões, reduzido gradualmente ao longo do tempo.