PM da Bahia assassina jovem estudante negra no bairro da Engomadeira em Salvador
A política de segurança pública do estado da Bahia segue de mãos dadas com a ordem burguesa, liderando o ranking de assassinatos por intervenção policial em bairros periféricos de maioria negra.

PMs no bairro de Engomadeira durante protesto pela morte de Ana Luiza causada por um outro policial militar, em 14 de abril de 2025. Reprodução/Foto: Marina Silva/CORREIO.
No domingo, dia 13 de abril de 2025, Ana Luiza dos Santos de Jesus, uma jovem estudante universitária negra de 19 anos, foi mais uma vítima fatal da polícia militar na Bahia, no bairro da Engomadeira, em Salvador. Seu assassinato, como de tantas outras pessoas negras e indígenas, foi divulgado enquanto consequência de uma operação da PM contra suspeitos, não coincidentemente, em mais um bairro periférico. Segundo moradores e trabalhadores, os policiais chegaram atirando no que deveria ser somente mais um domingo de lazer.
As imagens e vídeos produzidos pela vizinhança de Ana Luiza e de sua família escancaram a violência a qual a população negra é submetida. É possível ver como os assassinos fardados carregam a jovem e a colocam no fundo do camburão, sem qualquer cuidado com a vítima. Aos protestos da população, os mesmos assassinos respondem levantando as armas contra os moradores e lançando bombas de gás e spray de pimenta. Em gravações, ainda é possível ver quando um dos policiais agride um trabalhador que se aproxima, identificado em seguida pela população como sendo o pai da jovem assassinada.
Durante todo o dia seguinte, em 14 de abril, a PM da Bahia esteve presente no bairro a fim de coagir a população trabalhadora, periférica e negra contra a sua justa revolta sobre mais um episódio de letalidade policial. Após o enterro da jovem Ana Luiza, familiares, conhecidos e moradores do bairro vieram em protesto, andando pela Rua Silveira Martins até a entrada da Engomadeira, onde travaram o trânsito. A partir daí, a polícia passou a ameaçar de prisão quem estava no local, além de perseguir em suas casas, filmando os trabalhadores e sendo cada vez mais truculenta. Com isso, a população recuou para a Rua Direta da Engomadeira e ali permaneceu, gritando palavras de ordem como "polícia assassina", "23 assassina", fazendo referência à 23º Companhia Independente da PM, comandada pelo Tenente Coronel Luciano Jorge Alves da Silva.
No local, estiveram presentes as emissoras Record e Bandeirantes. Moradores da Engomadeira e conhecidos da jovem assassinada deram entrevistas muito tocantes e conscientes sobre qual é o verdadeiro papel da Polícia Militar. Por fim, a população começou a recuar ainda mais para dentro da Rua Direta da Engomadeira e, com a saída dos jornalistas, os assassinos passaram a atacar os trabalhadores em protesto. Com a superioridade técnica e a dispersão da maioria das pessoas, a manifestação foi facilmente reprimida, com os policiais lançando bombas na população por mais de uma hora. Em entrevista para o jornal Correio, uma moradora que não quis ser identificada diz que, mesmo um dia após os protestos, os PMs continuaram a ocupar as ruas e a intimidar moradores: “Os policiais estão na minha rua desde quando a imprensa foi embora, às 16h. Fechei meu restaurante e vim embora, está fazendo medo".
Como reação às manifestações, a Polícia Militar passou a ocupar o bairro e ameaçar moradores contra novos protestos. No dia 20 de abril, quando completaria sete dias de sua morte, os familiares e moradores coagidos tiveram que modificar o local de um ato pela vítima convocado anteriormente por eles, com medo das represálias e ameaças vindas dos PMs que cercavam o bairro com suas viaturas antes mesmo do protesto começar.
Infelizmente, Ana Luiza não é apenas um caso isolado, se tornando a décima vítima dos assassinos fardados em Salvador e Região Metropolitana no ano de 2025, de acordo com os dados do Instituto Fogo Cruzado. Essa é a realidade vivida pela população trabalhadora de todo o estado da Bahia.
No dia primeiro de dezembro do ano passado, dois jovens foram agredidos, xingados, obrigados a se deitarem e, assim, executados por um PM, no bairro de Ondina. Apesar de haver um vídeo bastante revelador feito por uma testemunha, o assassino teve a liberdade provisória concedida pela justiça em fevereiro. Ainda, enquanto o foco da capital era o turismo carnavalesco, uma operação policial deixou 12 pessoas mortas, em Fazenda Coutos, vindo a se tornar a 100ª chacina em Salvador e região metropolitana desde o início das pesquisas na Bahia realizadas pelo Instituto Fogo Cruzado, em julho de 2022.
Em janeiro de 2024, a PM deu cobertura para que milicianos rurais entrassem nas terras dos Pataxó Hã-hã-hãe e matassem a líder Nega Pataxó. Em março deste ano, a Polícia Civil, apoiada pela PM, invadiu a Terra Indígena da Barra Velha do Monte Pascoal, em Prado, no extremo sul do estado, com cerca de vinte viaturas, fazendo o uso de bombas e spray de pimenta, mesmo em anciãos e crianças, e prendendo mais de 20 indígenas Pataxó sem qualquer mandado de prisão. Nessa dita operação, homens mascarados, possivelmente pistoleiros, estavam em atuação com a própria polícia.
Muitas propostas são realizadas por uma série de agentes e atores políticos. A direita soteropolitana e baiana deixou um rastro de sangue em correlação com a Ditadura Empresarial-Militar, vide o carlismo e os seus atuais representantes, ACM Neto e Bruno Reis, do União Brasil (UB). Esses não possuem nada a adicionar para a classe trabalhadora, negra e periférica, apenas perpetuam a ideia de que não passamos de bandidos, marginais, passíveis de morte.
Esse fato não deve causar espanto à população, principalmente ao saber que ACM Neto foi um dos primeiros governantes municipais que, inconstitucionalmente, militarizou a Guarda Civil Municipal (GCM), armando suas forças de segurança há 13 anos, muito antes da tendência de militarização das guardas municipais das prefeituras pelo Brasil.
Entre 2022 e 2024, R$ 1,7 milhões foram investidos em armamentos, de um total de mais de R$ 7 milhões para a GCM, entre proteção individual, renovação de frota e compra de coletes balísticos, de acordo com a Secretaria de Comunicação da Prefeitura Municipal de Salvador. Não raro, atualmente é possível ver guardas municipais empunhando fuzis para o alto, não se importando com possíveis acidentes, sobretudo no centro de Salvador, pouco diferenciando-se das imagens compartilhadas de traficantes, exceto pelo fardamento azul. Também se intensificou a repressão a trabalhadores ambulantes, com episódios de violência ocorrendo cotidianamente.
O atual governo do estado, capitaneado pelo Partido dos Trabalhadores (PT), há 18 anos, pouco fez para mudar essa situação. Rui Costa (PT), então governador em 2015, em plena comoção nacional em relação à Chacina do Cabula, comparou a atuação da polícia militar ao futebol: "É como um artilheiro em frente ao gol que tenta decidir, em alguns segundos, como é que ele vai botar a bola dentro do gol, pra fazer o gol", disse. A esquerda neoliberal tão pouco possui projeto de segurança pública e evita fazê-lo, uma vez que criticar políticas como a infame “Guerra às Drogas” é, necessariamente, criticar os seus chefes burgueses e a própria lógica de reprodução do capitalismo.
Setores progressistas da esquerda neoliberal tentam propor medidas moralistas ou vigilantes sobre os policiais militares, como é o caso da utilização de câmeras em seus fardamentos como uma forma de melhorar o comportamento desses funcionários. Na prática, embora tenha existido uma redução na letalidade por algum tempo, nem sempre os policiais estão com as câmeras em suas fardas, como também já foram descobertas inúmeras formas de obstruir a coleta de evidências, seja tampando a lente com a mão ou, simplesmente, a mantendo desligada. Esse setor, ao que parece, se esqueceu de como funciona a própria estrutura da PM e de seus julgamentos internos, sem possibilidade de acompanhamento dos casos por parte da classe trabalhadora.
Embora tenha sido noticiado que a instalação de câmeras de segurança no fardamento dos policiais militares iniciaria ainda em maio de 2024, os assassinos envolvidos nesse episódio brutal não as utilizavam. O governador Jerônimo Rodrigues (PT) prestou uma solidariedade vazia de compromisso e o Comandante da 23ª Companhia, Ten.-cel. Luciano Jorge, se pronunciou sobre os procedimentos jurídicos e administrativos terem sido realizados e que os policiais envolvidos foram afastados; além de justificar em entrevista que apesar da primeira guarnição estar sem câmeras, a seguinte as usava e que, portanto, serão apuradas na perícia.
Fica claro que medidas como a instalação de câmeras no fardamento dos policiais militares é insuficiente se não se questiona a própria militarização da segurança pública no país. Logo, se faz necessário defender que todas as forças policiais e de segurança pública sejam desmilitarizadas e que, assim, a segurança pública seja exercida pela própria população em seu processo de auto-organização, inclusive contra o braço armado do estado, quando necessário. Para além disso, é crucial que os assassinos das populações negra, indígena e periférica do país sejam encaminhados para Júri Popular. É inaceitável que julgamentos de policiais militares sejam realizados pela corregedoria da própria PM, onde assassinos julgam outros assassinos como simples trabalhadores no cumprimento de suas ordens.
O Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), por meio do jornal O Futuro, se solidariza com a família da jovem Ana Luiza por essa perda irreparável. Como se encontrava nas camisas de manifestantes na noite de segunda-feira (14), “seu brilho foi apagado por uma injustiça que jamais será esquecida. Que sua luta, seu sorriso e seus sonhos inspirem para sempre a busca por um mundo mais justo e humano”. Firmamos aqui o compromisso de buscar justiça e fazer com que este e os outros casos de letalidade policial sejam expostos e condenados pela classe trabalhadora.