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  • Planos Safra cada vez maior: os bilhões para o agronegócio e a inflação de alimentos

    Haddad injeta mais R$ 4 bilhões no Plano Safra e celebra recordes em subsídios, prometendo combater a inflação de alimentos. No entanto, o aumento das queimadas e a concentração de terras expõem a fragilidade do discurso de sustentabilidade do governo, enquanto os preços altos impactam na mesa da população.

    23 de Março de 2025 às 15h00

    Reprodução/Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

    Por Kauana Niz

    Em entrevista ao ICL no dia 21 de fevereiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o governo pretende tornar os Planos Safra “cada vez mais robustos”. Após dois recordes consecutivos nos Planos Safra de 2023 e 2024, a meta é repetir o “sucesso” em 2025, ampliando as plantações e exportações, o que, segundo ele, ajudará a combater a inflação de alimentos.

    Durante a entrevista, Haddad destacou os elogios internacionais recebidos pelo Brasil por seu modelo de Agronegócio "sustentável", que expande a produção sem aumentar o desmatamento. Ele citou como exemplo os reconhecimentos obtidos durante sua recente viagem ao Oriente Médio, que posicionam o Brasil como uma liderança climática. Isso mostra a postura neoliberal de Haddad, ao defender um setor que, na realidade, não é nem um pouco sustentável, pois os dados ambientais revelam desmatamento e degradação.

    A declaração ocorreu em meio a uma polêmica envolvendo o setor do Agronegócio. No dia 20 de fevereiro, o governo surpreendeu ao anunciar a suspensão temporária de financiamentos rurais subvencionados, devido a não aprovação do orçamento para 2025 pela Câmara dos Deputados. Menos de 24 horas depois, porém, Haddad anunciou uma Medida Provisória (MP) de R$ 4 bilhões e encaminhou um ofício ao Tribunal de Contas da União (TCU) em busca de respaldo técnico e legal para retomar as linhas de crédito do Plano Safra 2024/2025.

    No dia 24 de fevereiro, o governo federal publicou a MP 1289/25, autorizando um crédito extraordinário de R$ 4,17 bilhões, com aval do TCU. Desse total, R$ 3,53 bilhões foram destinados ao Agronegócio (custeio, comercialização e investimentos), enquanto R$ 645,7 milhões foram alocados ao Pronaf, linha de crédito voltada à Agricultura familiar.

    O Plano Safra e a Inflação de alimentos: impacto na mesa do trabalhador

    Certamente quando o ministro afirma orgulhando-se que seu governo propôs os maiores planos da história, ele não está mentindo. O Plano de 2023/2024 foi de R$ 364,22 bilhões e o de 2024/2025 foi de R$ 409 bilhões e mais R$ 108 bilhões em recursos de LCA (Letra de Crédito do Agronegócio) foi destinado para emissões de CPR (Cédula de Produto Rural), somando-se a um total de R$ 508,59 bilhões apenas para o Plano Safra de 2024/2025. Deste, apenas R$ 71,6 bilhões foram destinados à Agricultura familiar.

    O setor do agronegócio no Brasil, além de ser beneficiado por bilhões em subsídios, também se favorece da Lei Kandir (Lei Complementar nº 87/1996), que o isenta do pagamento de ICMS sobre exportações de produtos primários e semielaborados. Esse setor vem ampliando sua dominação sobre as terras brasileiras ano após ano. Desde 2003, um ciclo intenso de grilagem de terras tem se mantido, e entre 2006 e 2017, os latifúndios expandiram suas áreas em 16,5 milhões de hectares.

    Dados do IBGE de 2017 mostram que propriedades com mais de 1.000 hectares representavam 47,5% da área ocupada, mesmo que constituíssem apenas 1% dos estabelecimentos rurais. Em 2018, de acordo com o INCRA, as grandes propriedades com mais de 15 módulos fiscais somavam 471,2 milhões de hectares, ultrapassando metade do território nacional.

    Por outro lado, pequenos produtores, que possuem até dez hectares, representavam 50,2% dos estabelecimentos, mas ocupavam apenas 2,3% da área total. Diante do estudo do MapBiomas de que o Brasil queimou 23% de seu território nos últimos 39 anos, e sabendo que os latifundiários concentram a maior parte das terras, é inevitável questionar: não seriam eles os verdadeiros responsáveis pela crise ambiental?

    Portanto, a afirmação de que o Agronegócio é "sustentável", propagada por figuras como Fernando Haddad, o presidente da COP30 André Corrêa do Lago, além de políticos liberais e setores da mídia, é uma falácia e omissão de dados científicos que tenta enganar a classe trabalhadora e esconder o maior emissor de gazes de efeito estufa do país. O objetivo por trás disso é claro: continuar matando os trabalhadores e as comunidades do campo, enquanto agradam à burguesia.

    Marina Silva, ministra do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, o presidente da COP-30, André Corrêa do Lago, e Lula. Foto: Brenno Carvalho/Reprodução: O Globo.

    Em 2024, o Brasil enfrentou uma crise ambiental sem precedentes: durante três meses, uma densa fumaça tóxica cobriu grande parte do território nacional, e o Agronegócio foi apontado como o principal responsável pelos incêndios que alimentaram essa nuvem poluente.

    Embora o ministro Fernando Haddad tenha destacado a Amazônia como um exemplo mundial de conservação ao ICL, os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) contam uma história diferente. O bioma registrou, em 2024, o maior número de focos de incêndio dos últimos 17 anos, com 140.346 ocorrências, muitas delas concentradas em áreas de expansão agropecuária e pastagens.

    Essa realidade expõe uma contradição alarmante: enquanto o governo celebra supostos avanços ambientais, o modelo agrícola atual, baseado na destruição de biomas para a produção de commodities, continua a impulsionar as mudanças climáticas e a perpetuar a dependência econômica do país.

    A concentração de queimadas em regiões de atividade agropecuária reforça a urgência de repensar esse sistema, que não só ameaça o meio ambiente, mas também compromete o futuro do Brasil diante da crise climática global.

    O argumento sobre financiar o Agro para garantir a diminuição da Inflação também é falso. O Brasil de Fato em uma reportagem escrita em 2024 que ainda segue atual,  destacou a relevância dos estoques reguladores de alimentos como mecanismo essencial para conter a inflação de alimentos que já estava muito alta desde o ano passado, estimativas do  Banco Central, bem como de outros órgãos de pesquisa,  avaliavam que os custos de comida no domicílio podiam superar os 7% até o fim de 2024. Tornando-se a maior alta dos últimos dez anos.

    Os estoques são formados por compras governamentais realizadas em períodos de preços baixos, com o objetivo de serem liberados ao mercado quando os preços sobem, ajudando a estabilizar o custo dos alimentos. No entanto, durante o governo genocida de Bolsonaro-Mourão, essa política foi extinta, resultando no esvaziamento quase total dos estoques públicos. Essa medida contribuiu diretamente para o aumento de 11,64% nos preços dos alimentos em 2022, mais que o dobro da inflação oficial registrada no mesmo período, que foi de 5,79%.

    Com a posse do governo neoliberal de Lula-Alckmin, houve a promessa de retomar os estoques reguladores. Entretanto, em 2023, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) concentrou suas aquisições principalmente em milho, deixando os estoques de produtos essenciais como arroz, feijão, café, mandioca e trigo praticamente zerados. Essa situação tem pressionado ainda mais a inflação atual.

    A falta de produção de alimentos básicos também é um problema, já que a área plantada de culturas como arroz e feijão diminuiu drasticamente, dando lugar à soja, voltada principalmente para exportação. E isso é o efeito direto do      Agronegócio  que já tratamos no EDC e n’O Futuro.

    Este, determina o que será produzido no campo, priorizando os interesses do mercado externo, das grandes empresas e dos latifundiários, pautando-se pelo lucro. O resultado disso é quatro décadas de redução das áreas plantadas de arroz e feijão, enquanto se prioriza a soja e o milho para exportação. Segundo o Ministério da Agricultura, a área de soja deve crescer 85% até 2033, enquanto a de arroz e feijão cairá 61%.

    Os fatores climáticos, diretamente causados pelo modelo do agronegócio, também contribuem para a inflação dos alimentos. Secas e enchentes reduziram a safra 2023/2024 em 4,7%, mesmo com o aumento da área plantada.

    Em fevereiro de 2025, o Banco Central projetou novos aumentos nos preços, com a taxa de inflação superando 15% ao ano em Junho, o maior patamar em quase duas décadas. A redação do Brasil de Fato entrou em contato com a Conab e o governo ainda em 2024. A Conab justificou a falta de estoques de alimentos além do milho, alegando que os preços de mercado não estavam abaixo dos valores mínimos necessários para compras.

    O governo esperava uma queda nos preços dos alimentos a partir de abril de 2025, mas, os dados do Banco Central mostram que essa expectativa não deve se concretizar. Além disso, o governo planejava medidas para priorizar a produção de alimentos no Plano Safra, iniciativa já iniciada por Haddad, mas que favorece apenas quem produz alimentos para exportação.

    A aposta do governo Lula-Alckmin tem sido priorizar o Plano Safra, destinando bilhões ao grande Agronegócio, enquanto omite os dados de destruição ambiental causados por esse modelo. Enquanto isso, a Agricultura familiar, que produz alimentos diversificados e sustentáveis, essenciais para a mesa do trabalhador, recebe o mínimo de recursos. O valor projetado para a reforma agrária corresponde a apenas 0,1834% do total do Plano Safra atual, evidenciando a escolha ideológica de um governo que, apesar de discursos progressistas, mantém uma política neoliberal que beneficia o Agronegócio em detrimento da soberania alimentar e dos direitos da população do campo, das águas e da floresta.

    Entenda como se deu a Suspensão Temporária

    Em 20 de fevereiro de 2025, o Ministério da Fazenda publicou o Ofício Circular SEI nº 282/2025/MF, suspendendo novas contratações de financiamentos rurais subvencionados, exceto para o Pronaf Custeio. A decisão foi tomada após a Secretaria de Política Econômica (SPE/MF) atualizar os parâmetros econômicos, elevando os custos das fontes de financiamento e resultando em um aumento não previsto nos gastos com equalização de taxas de juros, que excediam as estimativas do Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) 2025, que só agora foi aprovado pelo Congresso em 21 de março.

    Após essa decisão causar polêmica e pressão por parte dos setores do agronegócio, em nota divulgada pela Assessoria Especial de Comunicação Social do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar em 21 de fevereiro, foi esclarecido que a suspensão seria apenas uma medida temporária, reforçando mais uma vez o motivo: à falta de aprovação do orçamento federal para 2025.

    No entanto, as operações de custeio para a agricultura familiar e as linhas do Pronaf em regiões específicas continuariam disponíveis. Na mesma nota, o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, apelou aos congressistas para que aprovassem a peça orçamentária o mais rápido possível.

    Porém, em menos de 24 horas após a publicação do ofício circular do Ministério da Fazenda, no dia 21 de fevereiro, Haddad anunciou, em uma coletiva de imprensa, que encaminharia um ofício ao Tribunal de Contas da União (TCU) em busca de respaldo técnico e legal para a imediata retomada das linhas de crédito do Plano Safra 2024/2025.

    Haddad também anunciou uma Medida Provisória (MP) de R$ 4 bilhões, apontada pelo TCU como a única solução viável diante do atraso na tramitação orçamentária. Segundo o ministro, os recursos seriam acomodados posteriormente dentro dos limites do arcabouço fiscal, embora provenientes de “crédito extraordinário”.

    Para atender às demandas do grande empresariado do agronegócio, o governo federal publicou, em 24 de fevereiro, a Medida Provisória (MP) 1289/25, efetivando a promessa de Haddad com o aval do TCU, autorizando um crédito extraordinário de R$ 4,17 bilhões para financiar o Plano Safra 2024/2025.