Biblioteca Municipal Plínio de Almeida celebra 36 anos de resistência e luta por preservação

Espaço oferece um serviço de qualidade para a população itabunense mesmo sofrendo por mais de uma década com precarização do corpo técnico, falta de bibliotecários, climatização, e de verba para manutenção do espaço.

19 de Dezembro de 2025 às 21h00

Foto: Jornal O Futuro.

Por Daimar Stein

A Biblioteca Municipal Plínio de Almeida, localizada próxima ao centro de Itabuna, no sul da Bahia, foi inaugurada em 25 de setembro de 1989, e já contou com um acervo de 10 mil livros e mais de 500 pessoas cadastradas, que fazem empréstimos de livros no local. Sob responsabilidade da Fundação Itabunense de Cultura e Cidadania (FICC), a biblioteca conta com uma trajetória de resistência em uma cidade cujo poder público não fomenta sua cultura e não preserva sua história.

O Centro Cultural Josué Brandão, prédio onde a biblioteca se encontra, foi construído no final da gestão de Ubaldo Dantas (PDT) com o propósito de ser um espaço voltado exclusivamente para a cultura. Ao longo das últimas três décadas, o local se transformou em um importante polo cultural de Itabuna, abrigando não apenas a biblioteca, mas também salas destinadas a atividades artísticas, como aulas de música, dança, pintura e teatro, além do Arquivo Público Municipal. A história do Centro Cultural é longa e tortuosa, o espaço tem sofrido durante toda a sua existência com a falta de uma política de manutenção e preservação do patrimônio público, levando mais de uma vez a uma situação de abandono pelo poder público, ao ponto de que a primeira reforma estrutural no espaço só foi realizada mais de 20 anos depois de sua inauguração.

O primeiro grande baque no funcionamento do Centro Josué Brandão aconteceu quando foi feita a transferência da Câmara Municipal de Itabuna para o local. Essa mudança resultou na tomada, com o passar dos anos, de mais da metade do espaço originalmente ocupado pela biblioteca, além de metade das salas originalmente dedicadas aos projetos culturais, e a transformação do auditório, que antes era utilizado para apresentações de teatro e de música, em espaço exclusivo da Câmara. Tudo isso feito sem nenhum retorno ou compensação aos projetos que originalmente usavam o espaço.

Dos diversos grupos e projetos que antes utilizavam e davam vida ao espaço, apenas a Biblioteca Plínio de Almeida ainda existe de forma ativa no local, graças aos esforços dos técnicos que trabalham lá e da comunidade que se criou no espaço, formada principalmente por ''concurseiros'' e outros estudantes, que precisam de um local silencioso para se preparar. O que restou dos projetos voltados para produção artística foi agrupado pela FICC em um único programa e transformado na atual Escola de Talentos, hoje realizada no Centro de Cultura Adonias Filho.

Durante a gestão de Cyro de Mattos da FICC, a biblioteca chegou a receber diversas contribuições e melhorias, especialmente entre 2009 e 2011, onde recebeu em torno de 3 mil livros, através de doações de diversas editoras, da Fundação Pedro Calmon e da Fundação da Biblioteca Nacional, além de todo um acervo de livros infantis, DVDs e CDs, através do Programa Livro Aberto. Segundo Cyro, o objetivo era "tornar a nossa biblioteca um espaço criativo, dinâmico e saudável, e não um simples depósito de livros, o que não condiz com uma cidade do porte de Itabuna". A biblioteca já foi espaço de lançamento de diversos livros de autores locais, exposições, além de até hoje contar com visitas escolares para formações sobre a história da cidade.

Um dos grandes problemas com o qual a biblioteca teve que lidar na última década é a falta de um bibliotecário, o que viola o Art. 3º da Lei n. 4.084/1962 e o Decreto 56.725/1965, que regulamentam a profissão de bibliotecário e garantem a necessidade da contratação de um profissional habilitado e bacharel em biblioteconomia para a administração de bibliotecas públicas. Segundo relatos, durante anos um bibliotecário era tecnicamente contratado, mas nunca aparecia no local, e atualmente não há sequer um profissional contratado para gerenciar o espaço. O resultado prático disso é a sobrecarga e precarização, tanto dos técnicos contratados para cuidar do espaço quanto da categoria dos bibliotecários como um todo, que já sofre com falta de oportunidades de trabalho. Só entre 2015 e 2022 o país já perdeu mais de 800 bibliotecas públicas.

Outra das consequências práticas da falta de um bibliotecário é a perda de oportunidades de formação para todo o corpo técnico, como a participação nos Encontros de Bibliotecas Públicas, Comunitárias e Espaços de Leitura, promovidos pela Fundação Pedro Calmon, em Salvador. Sem um profissional formado, o espaço não consegue verbas para garantir a representação nesses eventos, sendo forçados a tirar recursos do próprio bolso para ir.

O desmonte do espaço também acontece na parte tecnológica. Os computadores que eram disponibilizados para o público foram transferidos para outros locais pela FICC há quase uma década. Apenas através do esforço e de doações pessoais dos técnicos e da comunidade local, os computadores que até hoje estão disponíveis no local foram montados. Há também a falta de uma modernização do sistema da biblioteca, que ainda depende de fichas de papel para garantir o controle de fluxo dos livros.

Para além disso, por anos o espaço está com seu sistema de climatização quebrado, forçando os técnicos a abrir janelas em períodos de calor e colocando alguns dos livros em risco de danos em situações de chuva, além do acúmulo de poeira. Uma das áreas internas se encontra interditada já que, após a última reforma do espaço, que nunca foi devidamente concluída, uma das paredes não teve as janelas instaladas, transformada apenas em meia parede gradeada, o que permite a entrada de água da chuva, que, além de forçar o corpo técnico a retirar tudo do local por conta do risco de danos aos livros e equipamentos, causou infiltrações e danos estruturais à parede, o que levou à interdição da área pelo Corpo de Bombeiros.

Uma das salas da biblioteca, em necessidade de reparos, armazenando o equipamento de climatização em meio a prateleiras de livros. Foto: Jornal O Futuro.

Uma das partes interditadas devido à meia parede permitindo infiltração de água. Foto: Jornal O Futuro.

Durante as enchentes que assolaram a cidade em 2021, o que foi resgatado do Arquivo Público Municipal por uma equipe de voluntários foi transferido para a biblioteca, onde até hoje se encontra. Uma das promessas de campanha durante as últimas eleições municipais foi justamente o tombamento da biblioteca para garantir sua preservação, que não foi cumprida e não há sequer um plano traçado para fazê-lo. Somente através das intervenções feitas pelo público durante a recente Audiência Pública sobre o Patrimônio Histórico de Itabuna, realizada no dia 24 de outubro, é que a preservação da biblioteca foi sequer mencionada.

Apesar da falta de investimento, a biblioteca nunca deixou de avançar na luta pelo incentivo à leitura e preservação da história da cidade. O espaço conta com um programa constante de visitas das escolas que compõem a Rede Municipal de Ensino, para garantir que os estudantes conheçam e frequentem o espaço, além de tocar atividades como a Exposição Identidade Grapiúna, feita em 2023, mostras do acervo de fotos que retratam a história de Itabuna, além de livros de escritores locais e regionais, e como o Projeto Letras de Abril, promovendo atividades para estímulo e motivação com o suporte de filmes, vídeos, contação de histórias, estande de leitura, música, dentre outros, em comemoração às datas relacionadas à leitura que ocorrem nesse mês.

A biblioteca também já foi palco de eventos de lançamento de livros de Telmo Padilha, Plínio de Almeida, Gustavo Felicíssimo, Manoel Tenório, Ruy Póvoas, Cyro de Mattos, dentre muitos outros, como parte da política de valorização de autores regionais, além de outros lançamentos de autores como Adonias Filho e Manoel Lins, através de parcerias com as editoras Editus, da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e Via Litterarum, de Ibicaraí.

Recentemente, a equipe da Plínio de Almeida participou da Festa Literária da Região Cacaueira, (FLICACAU), evento dedicado à leitura sediado no Centro Cultural Adonias Filho no final de novembro, divulgando o trabalho da biblioteca e facilitando para a população a criação dos cartões necessários para empréstimos de livros no local.

O espaço até hoje conta com computadores e acesso gratuito a Wi-Fi como forma de auxílio e suporte à pesquisa e estudo, além dos já mencionados empréstimos de livros para toda a população, disponíveis facilmente pelo cadastro no local, exigindo apenas um documento de identidade, comprovante de residência e telefone para contato. A biblioteca também disponibiliza diversos livros e quadrinhos infantojuvenis, incentivando a leitura desde a infância por diversas formas.

Com sua trajetória marcada pela valorização da cultura e do conhecimento, a Biblioteca Plínio de Almeida continua sendo um espaço fundamental para estudantes, pesquisadores e toda a comunidade itabunense, preservando a memória e incentivando o saber. Em tempos onde o acesso a leitura fica cada vez mais caro e inacessível para a população é necessário lutar pela preservação e expansão das bibliotecas públicas, que oferecem acesso gratuito a leitura, além de espaço de estudo para toda a população.