Banco do Brasil pressiona para aumentar a jornada de trabalho dos bancários

A direção comunicou mudanças nos cargos de assessoramento, introduzindo a discutível “oportunidade de adesão voluntária” a vagas com jornada de 8 horas. Essa medida visa alterar a relação de trabalho dos assessores, cuja jornada diária é atualmente de 6 horas.

24 de Novembro de 2025 às 18h00

Ato contra a jornada de 8h em frente ao Edifício Sede III do Banco do Brasil. Reprodução/Foto: SEEB-DF.

Por Rhuan Maciel

Na noite do dia 2 de outubro, o Banco do Brasil (BB) surpreendeu os trabalhadores ao anunciar uma reunião obrigatória para a manhã seguinte em todas as diretorias, com a pauta intitulada “Movimentos Estruturantes”. A repentina convocação gerou imediato temor e apreensão na categoria, visto que anúncios súbitos dessa natureza são historicamente associados a mudanças que impactam negativamente as condições de trabalho. Durante o encontro, a direção comunicou mudanças nos cargos de assessoramento, introduzindo a discutível “oportunidade de adesão voluntária” a vagas com jornada de 8 horas.

Essa medida visa alterar a relação de trabalho dos assessores, cuja jornada diária é atualmente de 6 horas, conforme estabelece o Artigo 224 da CLT: “A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 (trinta) horas de trabalho por semana.”. Neste novo ataque, o BB estipula que 25% desses setores devem ser convertidos em cargos de 8 horas diárias. Além disso, existe uma grande chance do Banco do Brasil realizar um novo aumento de 25% no próximo período, atingindo, portanto, metade dos trabalhadores do setor. Embora o assalariamento seja proporcional ao aumento da jornada, a medida se traduz em um aumento do tempo de trabalho sem ganho real por hora trabalhada para a categoria.

Após o anúncio, todos os gerentes das diretorias foram instruídos a conduzir reuniões para mensurar a recepção às mudanças. A resposta foi largamente negativa, expondo um clima de insatisfação generalizada. O movimento de pressão velada e a necessidade de a gerência intermediária atuar como porta-voz dessas medidas não apenas reforçaram a apreensão e a resistência da base, como também evidenciaram a precarização dos gerentes de baixo escalão, cuja remuneração se aproxima dos assessores de nível mais alto que eles próprios gerenciam.

Além disso, a categoria tem observado uma corrosão salarial contínua e alarmante, impulsionada por reajustes pífios em Acordos Coletivos de Trabalho (ACT) e Convenções Coletivas de Trabalho (CCT) bianuais, resultando em ganho real quase inexistente. Essa desvalorização fica evidente no reajuste de setembro deste ano, de apenas 5,68%, que sequer repõe integralmente o custo de vida sentido na capital paulista, com o índice de inflação de 5,72%, reforçando a perda real do valor dos salários. No entanto, a verdadeira dimensão da queda do poder de compra é revelada pela comparação histórica com o salário mínimo necessário, calculado pelo DIEESE: se em agosto de 1995 o salário de ingresso no BB (cerca de R$ 732,00) estava quase em paridade com o mínimo do DIEESE (R$ 723,65), hoje, em outubro de 2025, o salário de ingresso de R$ 4.189,05 para o escriturário está mais de 41% abaixo do valor necessário para a subsistência de uma família (R$ 7.116,83). Essa queda brutal na equivalência, que em menos de três décadas transformou o salário de referência da categoria em um valor insuficiente, demonstra que a adesão à jornada de 8 horas não é uma escolha, mas sim uma obrigação financeira imposta pelo estrangulamento salarial histórico.

Esta nova investida soma-se à drástica redução salarial imposta aos funcionários do BB a partir de 2020, com o programa "Performa". Sob o pretexto de “busca constante de eficiência e de manter a competitividade da empresa”, o banco promoveu cortes que, em alguns casos, atingiram até 40% da remuneração dos bancários. Essa parcela fixa foi transferida para o Programa de Desempenho Gratificado (PDG), uma renda variável na qual apenas  40% dos funcionários com melhor desempenho fariam jus a uma gratificação que, teoricamente, poderia atingir até quatro salários anuais.

A discutível “adesão voluntária” às 8 horas de jornada se revela uma tática de coerção. Diante da corrosão histórica do poder de compra, da precarização imposta pelo programa “Performa” e dos reajustes insuficientes que fazem a categoria perder em relação ao salário mínimo, a oferta de um cargo de jornada estendida com reajuste proporcional, ou seja, sem aumento real por hora, é, na verdade, uma obrigação financeira velada. O Banco do Brasil capitaliza sobre o estrangulamento salarial preexistente, forçando os trabalhadores a venderem mais duas horas de seu dia apenas para mitigar perdas e garantir uma remuneração minimamente digna.

Diante da gravidade da situação, a resposta mais visível partiu do Sindicato dos Bancários de Brasília (SEEB/DF), região mais afetada pela reestruturação das diretorias. Mas sua atuação se insere na linha sindical cutista que historicamente tem contribuído para o apassivamento da categoria. O sindicato tem concentrado seus esforços em duas frentes limitadas: a tradicional e lenta batalha judicial, delegando a defesa dos direitos aos tribunais, e a realização de atos e protestos de caráter notadamente performático em frente aos grandes edifícios do BB. Essa estratégia busca visibilidade e denuncia o ataque, mas recorre a instrumentos de pressão que não promovem a mobilização e a autoorganização da base, transformando a resistência em rituais controlados, reflexo da burocracia que há décadas pauta a luta da categoria bancária.

A crise do sindicalismo praticado pela CUT, evidenciada pelas sucessivas derrotas das últimas décadas, demonstra que a luta por direitos não pode ser terceirizada aos tribunais ou a rituais midiáticos. É imperativo que a categoria bancária, protagonista de greves históricas, retome o controle de seus instrumentos de luta. A superação da burocracia e o enfrentamento real ao arrocho salarial exigem que os trabalhadores se autoorganizem, retomem a disputa dos sindicatos e construam um sindicalismo a partir da base, classista e independente. Em resposta a essa necessidade e à crise de representação, surge a Alternativa Bancária DF - Reconstrução pela Base. Este movimento, composto por bancários da ativa e aposentados do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal e do BRB, é a tentativa concreta de resgatar a perspectiva de enfrentamento, trazendo para a base a responsabilidade pela luta direta contra a gestão do capital financeiro. A batalha contra a jornada de 8 horas é, portanto, um campo de testes crucial para o futuro da organização da categoria.