57 anos da Greve de Contagem
A Greve de Contagem, organizada por operários do setor metalúrgico em pleno aprofundamento do regime empresarial-militar, foi um dos primeiros e mais corajosos movimentos grevistas a desafiar a repressão do governo Costa e Silva.

Trabalhadores da Belgo-Mineira em Contagem/MG em abril de 1968 - Reprodução/Foto: Arquivo Público do Estado de São Paulo/Fundo Última Hora
Por Diego Miranda
Em abril de 1968, enquanto o Brasil vivia sob a repressão da ditadura empresarial-militar, uma cidade da região metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais, deixou seu legado na história de resistência operária. A Greve de Contagem, organizada por operários do setor metalúrgico em pleno aprofundamento do regime empresarial-militar, foi um dos primeiros e mais corajosos movimentos grevistas a desafiar a repressão do governo Costa e Silva. Quase 16 mil trabalhadores paralisaram as fábricas, exigindo melhores salários e condições de trabalho – e pagaram um alto preço por isso.
Desde o golpe empresarial-militar em 1964, os processos de repressão avançaram, enquanto a classe trabalhadora vivenciava o arrocho salarial. Enquanto o governo realizava apenas reajustes irrisórios, os salários eram corroídos em função da inflação. Para conter esse movimento de insatisfações, foi instaurada a Lei Antigreve (Lei nº 4.330/1964), que tornava as greves praticamente ilegais, além de realizar intervenções nos sindicatos, cassando várias diretorias sindicais e colocando, no lugar, interventores nomeados pelo governo.
No dia 16 de abril de 1968, os operários de grandes fábricas, como a Belgo-Mineira, da siderurgia, e a Mannesmann, da metalurgia, cruzaram os braços. Logo foram seguidos pelos operários da Acesita, RCA Vitor, Demissa, Industam, SIMEL, Metalúrgica Triângulo, Pollig-Haakel, Minas-Ferro, Mafersa, entre outras. A pauta era clara: 1) aumento salarial de 25%; 2) melhores condições de trabalho; e 3) fim das perseguições aos dirigentes sindicais. Embora pareça, a greve não foi espontânea: foi construída de forma clandestina através de comitês de fábrica.
A reação do governo Costa e Silva foi enviar o então ministro do Trabalho, general Jarbas Passarinho, entre os dias 20 e 23 de abril. O ministro passou a intervir diretamente nas negociações, chegando a participar de uma assembleia dos trabalhadores e fazer ameaças na televisão. Mas isso não foi suficiente para intimidar o movimento grevista e fazer os trabalhadores recuarem. No dia 24 de abril, 1.500 policiais militares (PMs) e as forças do Exército foram enviados para Contagem para cercar as fábricas e fazer batidas na casa dos operários. A repressão ameaçou demissão sumária de vários operários e prendeu 20 lideranças do movimento. Na prisão, as direções do movimento grevista foram interrogadas sob tortura. Apesar da repressão, a greve só terminou quando o governo concedeu um aumento de 10%, menos do que era reivindicado pelo movimento.

Coronel Jarbas Passarinho na Assembleia dos Trabalhadores em Contagem/MG em abril de 1968 - Reprodução/Foto: Arquivo Público do Estado de São Paulo/Fundo Última Hora
Apesar de não ter alcançado todas as suas demandas, a Greve de Contagem teve um impacto duradouro de enfrentamento à ditadura empresarial-militar e na memória operária. Mesmo sob tortura e censura, os trabalhadores mostraram que a luta operária era possível nessas condições. Nesse sentido, inspirou outros movimentos no mesmo ano, como o 1º de maio na Sé, em São Paulo (SP), e posteriormente a greve de Osasco (SP) em julho.
Em 1º de outubro de 1968, os metalúrgicos de Contagem fazem uma nova greve. A greve de outubro foi caracterizada por uma maior organização e planejamento, com a formação de um comando de greve e maior divisão de tarefas entre os operários. Dessa vez, a repressão é ainda pior, as prisões começaram ainda durante sua preparação. No primeiro dia, as tropas de choque já ocupam a cidade e invadem as fábricas, os líderes do comitê de greve são presos e o sindicato é posto sob intervenção. Mais de 150 operários são demitidos e a paralisação acaba no dia 3.
No final de 1968, os militares, apoiados pelos empresários, editaram o Ato Institucional nº 5 (AI-5), fecharam o Congresso Nacional e assembleias legislativas dos estados, cassaram mais de 170 mandatos legislativos, autorizaram o presidente a intervir nos governos e suspenderam direitos e garantias constitucionais, tornando institucionais as torturas, prisões e perseguições.
Esses acontecimentos servem para evidenciar o caráter de classe da ditadura empresarial-militar, demonstrando os interesses da burguesia brasileira e internacional em salvaguardar seus interesses frente aos interesses dos trabalhadores. Cada greve e enfrentamento revelavam aos trabalhadores que os empresários e o governo Costa e Silva eram seus inimigos e que era necessário lutar contra eles. Os operários de Contagem foram o grande exemplo desse enfrentamento e nos deixaram o legado de combatividade a toda forma de exploração e opressão.