Em Fortaleza, estudantes denunciam situação precária da merenda escolar
Os militantes da UJC organizados na escola decidiram por iniciar a agitação por um ato contra a precarização da merenda, denunciando o Governo e a Seduc-CE como responsáveis pela terceirização que possibilita que cenários como esses não sejam incomuns nas escolas do Ceará.

Ato dos estudantes da EEEP Darcy Ribeiro contra a precarização da merenda escolar. Foto: Jornal O Futuro.
Por João Lucas Leite
No dia 05 de novembro, estudantes da EEEP (Escola Estadual de Ensino Profissional) Darcy Ribeiro, em Fortaleza, realizaram um ato denunciando a precarização da alimentação na sua escola, levantando cartazes apontando a terceirização como um ataque à educação pública. O protesto surge num cenário de ausência, atraso e baixa na qualidade da merenda da instituição de ensino, em decorrência da falência da empresa terceirizada que fornece os alimentos para a escola.
A terceirização avança sobre as escolas e universidades do Brasil, conforme já noticiado pelo Jornal O Futuro. No Ceará, estado brasileiro que é utilizado de propaganda como “exemplo para a educação” no país, o caso é ainda mais grave: as escolas públicas estaduais, organizadas em EEEP, EEMTI (Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral) e EEM (Escola de Ensino Médio regular), estão tendo a situação da alimentação das escolas constantemente afetadas pelo processo, prejudicando a educação dos alunos que, em sua maioria, passam a maior parte do seu dia na escola — ou no estágio obrigatório de seu curso técnico, no caso das escolas profissionais.
O Estado do Ceará, hoje governado por Elmano de Freitas (PT), é colocado como essa referência pela expansão do Programa Escola em Tempo Integral e pelas parcerias público-privadas presentes na gestão das escolas no Estado. O projeto neoliberal de privatização da educação pública avança a passos largos em todo o país, seguindo os interesses privados da burguesia brasileira, aliado à necessidade de expansão do ensino para formar mão de obra — que encontra correspondência na universalização do ensino integral e expansão do ensino profissional. Dentre as medidas para retirar do Estado o papel de garantir uma educação pública, gratuita e de qualidade, está a de terceirizar os serviços que deveriam ser prestados pela Secretaria de Educação e pelo Governo do Estado.
O serviço da merenda nas escolas hoje é terceirizado, colocando a responsabilidade em empresas privadas na alimentação de milhares de estudantes em escolas públicas. Essas empresas, atuando sob a lógica mercadológica do lucro, ao invés de buscar garantir a prestação de um bom serviço e, por consequência, uma alimentação de qualidade, buscam reduzir suas despesas e aumentar seus rendimentos. Na EEEP Darcy Ribeiro, a empresa que fornecia o serviço à escola entrou em processo de falência, o que resultou na diminuição dos custos de funcionamento para reduzir seu prejuízo. Na prática, a redução nas perdas de números na tela dos donos da empresa gerou a falta de comida na escola, o atraso na entrega dos alimentos e a insegurança dos funcionários (chamados popularmente de merendeiros) em relação aos seus empregos.
Os estudantes relataram diversas situações em que a comida atrasa para ser preparada, por conta dos alimentos não terem chegado à escola com antecedência para o preparo, além de uma queda brusca na qualidade e repetição dos mesmos alimentos todos os dias. “As coisas [comida] chega só no dia certo de fazer, não chega antes. Aí os alunos têm consciência de que não é nós funcionários, é a empresa que tá fazendo isso né?! Porque nós tamo aqui pra cumprir ordem.” — relatou um merendeiro da escola. O estopim para a indignação geral dos alunos e funcionários foi quando chegou à escola para ser preparado para o almoço somente 40 ovos para uma escola com mais de 400 alunos.
Em resposta a essa situação, os estudantes se organizaram de maneira independente para reivindicar resolução imediata para seus problemas. Os militantes da UJC organizados na escola decidiram por iniciar a agitação por um ato contra a precarização da merenda, denunciando o Governo e a Seduc-CE como responsáveis pela terceirização que possibilita que cenários como esses não sejam incomuns nas escolas do Ceará.
A UJC, contando com o suporte de diversos estudantes independentes, agitaram durante dois dias no portão da escola no horário de saída dos estudantes utilizando da própria voz, megafone, agitação nas redes sociais e panfletos sob a palavra de ordem “40 ovos para 400 alunos é fuleragem!” — remetendo a situação que foi estopim para a indignação dos estudantes. Apesar de serem claros na agitação, apontando o governo como responsáveis pelo ocorrido e não a gestão da escola, o comando do protesto enfrentou desafios com relação à gestão escolar que, segundo relatos de estudantes entrevistados, “enxergou a manifestação como um ‘ataque’ à escola” e atuou para desmobilizar o ato. Para evitar embates diretos com a gestão, os articuladores do protesto resolveram manter a mobilização fora da jurisdição da escola (no portão ao horário de saída), não passando em salas ou panfletando dentro da instituição.
Após o início da mobilização, rapidamente a Seduc-CE foi à escola tentar desmobilizar os estudantes prometendo resolução ao problema. Contudo, o comando do protesto tendo conhecimento de diversos relatos em que os estudantes se mobilizam e a Seduc-CE promete, mas não cumpre, foi decidido a continuação da mobilização e da luta pela melhoria da merenda.
Os alunos, de maneira independente, pediram resmas de panfletos para entregar para seus colegas de sala enquanto as panfletagens aconteciam. A mobilização aconteceu nos dias 3 a 4 de novembro, tendo boa receptividade dos estudantes. O ato ocorreu no dia 5 ao final da aula, reunindo todos em frente à escola portando cartazes confeccionados pelos estudantes no horário de almoço carregando dizeres como “Darcy Ribeiro teria vergonha do descaso com a educação no Brasil”. O protesto foi um sucesso, com a situação tendo sido resolvida com extrema agilidade pelo Governo do Estado após a pressão dos estudantes.
Entretanto, a terceirização como ramificação do projeto político da burguesia neoliberal permanece, deixando bem claro que embora os estudantes do Darcy Ribeiro tenham conquistado uma vitória em relação a sua alimentação, situações como essa podem voltar a acontecer assim como acontece em centenas de outras escolas no Brasil.