Privatizações e contratos sem licitação viram marca do governo Ratinho Junior (PSD)
Em meio a contratos sem licitação, negação ao debate público e relações escusas, Ratinho Jr entrega a soberania e a privacidade de paranaenses ao setor privado.

Reprodução/Foto: CELEPAR.
Em 24 de setembro de 2024, o governador Ratinho Jr (PSD) afirmou que o “Paraná é o estado que mais fez concessões, privatizações e PPPs no Brasil”. Em seu mandato, o governador lidera as concessões rodoviárias no país - com 3,3 mil quilômetros de rodovias sob administração privada - e já privatizou as empresas: Sercomtel, empresa de telefonia com sede em Londrina; Copel Telecom, subsidiária da Copel na área de internet e fibra óptica e a própria Copel, companhia responsável por geração, transmissão e distribuição de energia elétrica em todo o Estado do Paraná; e mais recentemente a Sanepar, companhia de saneamento de águas do Paraná. Além desses, o programa estadual contempla a Pedreira do Atuba, quatro aeroportos, pátios do Detran e concessão do Parque Estadual de Vila Velha, em Ponta Grossa.
Na privatização da Copel, o presidente do BTG Pactual, André Esteves, foi um dos controladores do processo contratados pelo governo do Paraná para estruturar a oferta. O banqueiro preso em 25 de novembro de 2015, mas posteriormente solto com caso arquivado pelo STF, se gaba em diversas vezes de sua participação no processo. “Em três anos privatizamos três das seis maiores empresas sob o controle do Estado. Privatizamos esse ano a Sabesp, que é a maior empresa de saneamento do Brasil; privatizamos, ano passado, a Copel, que era a maior empresa sob controle estatal de energia; e, no ano anterior, privatizamos a Eletrobrás [...] e não teve um protesto [sequer], não apareceu ninguém na sede do BTG com cartazinho de cartolina dizendo: sou contra, né?!” disse André Esteves no dia 25 de fevereiro de 2025, no CEO Conference 2025 do BTG Pactual, que contou com a presença do Ministro da Fazenda Fernando Haddad. O banqueiro tornou a repetir o discurso em ocasiões posteriores.
A empresa foi adquirida pela 3G Radar, dos bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, os mesmos responsáveis pelo colapso das Lojas Americanas; pelas estadunidenses GQG Partners, Dimensional Fund, Vanguard Group e Zimmer Partners; GIC, fundo soberano de Cingapura; SPX Capital; entre outras. Importante notar que, logo após a privatização, os executivos se apressaram a aprovar a “adequação da remuneração dos Administradores, Conselheiros Fiscais e Membros de Comitês Estatutários de 2023”, garantindo um aumento de 50% de remuneração a si mesmos.
A privatização, objeto de muito orgulho do governador e banqueiros, gerou a piora do serviço prestado à população do estado do Paraná. Comparando os números disponibilizados pela Aneel, entre setembro a dezembro de 2022, quando a empresa era propriedade estatal, com o período de setembro a dezembro de 2023, após a privatização, o tempo médio de atendimento aumentou 34,4% e o “Tempo Médio de Preparação” (TPM) saltou em 44,9% na média quadrimestral.
É nesse cenário de entrega de serviços estratégicos do estado a empresas privadas, em sua grande parte estrangeiras, com piora de serviços à própria população, que o governador Ratinho Jr pretende concluir, ainda neste ano, a privatização da Ferroeste e, de maneira extremamente indevida, da CELEPAR (Ofício circular n°47/2025 da Casa Civil).
A Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (CELEPAR), executa em torno de R$2,25 bilhões em serviços contratados pelo estado do Paraná e teve lucro de R$200 milhões em 2023. Informações pessoais da população – prontuários médicos, histórico escolar, registros policiais, dados fiscais, benefícios sociais, documentos individuais, endereços e geolocalização – são processadas pela empresa que gere toda a máquina pública estadual. Esses são considerados dados valiosíssimos pela iniciativa privada e cruciais para a administração pública com responsabilidade e compromisso com o interesse coletivo. A gestão paranaense pretende entregar, sem nenhum debate público, a privacidade e a segurança do povo a uma empresa privada cuja única intenção é o lucro. Tal relação abre espaço para utilização imprópria dos dados individuais, como sua comercialização para direcionamento político, controle social e exclusão de direitos.
O “Termo de Anuência da Operação”, assinado pelo secretário da Casa Civil, João Carlos Ortega, permite a desestatização e a exploração comercial dos softwares da CELEPAR e outros órgãos públicos, desenvolvidos com verba pública. Com uma fuga implacável de todos os debates públicos, o governo de Ratinho Jr estabeleceu o pagamento de R$30 mil para interessados em participar de uma audiência virtual no dia 3 de setembro e um depósito caução de R$350 mil para acessar os detalhes da privatização. A justificativa de "confidencialidade" é totalmente contrária ao princípio de transparência e concorrência.
No dia 17 de janeiro de 2025, o escritório Reis, Varrichio e Carrer Sociedade de Advogados foi contratado, com dispensa de licitação, para realizar “serviços especializados de avaliação técnica e jurídica das decisões que concederam imunidade tributária à CELEPAR”. Contratada, dia 23 de janeiro, por R$ 8,7 milhões em um processo novamente sem licitações, a Ernst & Young Assessoria Empresarial Ltda ficou responsável por “prestação de serviço de assessoria, visando estudo técnico, análises e operacionalização de processo de alienação”, segundo o Portal da Transparência. Toda a constante dispensa de licitações pelo governo do estado durante o avanço da privatização chama a atenção e gera questionamentos por parte do Ministério Público do Paraná e do Tribunal de Contas do Estado.
O gosto de corrupção deixado ao longo do processo vem da orientação do próprio governo aos órgãos estaduais para: antecipação de renovação dos contratos com a CELEPAR até outubro deste ano ou que rescindam os atuais e firmem novos contratos com o prazo máximo de cinco anos. Dessa forma, garantindo que o comprador assuma a empresa com contratos bilionários já firmados.
No mesmo sentido, o presidente da empresa, André Gustavo Garbosa, entrou em férias no exato dia em que, com uma semana de antecedência, havia sido convocado ao Senado para discutir os possíveis riscos da privatização. Garbosa já havia admitido, em 2024, que dados poderiam ser vendidos: “Imagina o seguinte cenário: vai ter alta temporada no litoral. Eu sou dono de uma mercearia ou lojinha e quero saber o que o pessoal anda comprando. Essas informações nós temos, e a gente pode vender. A venda de informações é um negócio em que todo mundo ganha. Isso é a monetização de dados, e nós estamos trabalhando forte na CELEPAR”. Fica claro que o estado do Paraná está prestes a abrir mão de sua soberania digital.
A privatização também entra em confronto com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) de 2018, que impede que informações de segurança pública sejam processadas pela iniciativa privada.
Multinacionais italianas, canadenses e irlandesas já declararam interesse no leilão marcado para novembro, o que reacende o alerta para a progressiva perda de soberania que passa o Brasil através das constantes privatizações de suas empresas em setores estratégicos da economia nacional.