Desregulamentação do trabalho no Brasil e o significado do 1° de Maio
A história da desregulamentação do trabalho no Brasil e os ataques sistemáticos à classe trabalhadora demonstram a necessidade da construção do 1º de Maio como Dia Internacional do Trabalhador.

Manifestação do 1° de Maio no Pacaembu - Reprodução/Foto: Arquivo Agência Brasil.
Por Stella
A Consolidação de Leis do Trabalho (CLT) surgiu em 1943, pelo Decreto-Lei n°5.452 de 1º de Maio de 1943. Essa legislação, que existe até os dias atuais, foi fruto de um intenso processo de lutas da classe trabalhadora desde o final do século XIX até a primeira metade do século XX. A CLT deu à classe trabalhadora garantias mínimas, como a jornada de trabalho de 8 horas diárias ou 48 horas semanais, o descanso semanal remunerado (DSR), as férias remuneradas; o adicional de férias (⅓ a mais do salário); o salário mínimo (que já era previsto desde 1936, mas foi enfim regulamentado), e a proteção ao trabalho da mulher e do menor.
Na década de 50, a continuidade da luta dos trabalhadores avança também para a conquista da Lei nº 2.757/1956 que estabeleceu o 13º salário (gratificação natalina), inicialmente apenas para os trabalhadores da indústria, e a Lei nº 4.090/1962 que estendeu o 13º salário a todos os trabalhadores.
Apesar de ter como objetivo reunir as leis trabalhistas que garantem o mínimo de segurança nas relações de trabalho, a CLT também passou pela resistência dos capitalistas em relação à extensão dos direitos dos trabalhadores. Hoje, o Brasil vive um cenário em que as relações de trabalho sofrem processos de desregulamentação. Na década de 90, a burguesia brasileira acirrou os sistemáticos ataques aos direitos trabalhistas e se empenhou na criação de modalidades precárias de trabalho, como a terceirização e o estímulo à informalidade.
No período da ditadura empresarial-militar, houve profundas mudanças na flexibilização das relações trabalhistas, como a criação do regime de trabalho temporário (Lei nº 6.019/1974), a substituição da Estabilidade Decenal (Lei nº 5.107/1966) pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); e a criação do estágio profissional (Lei nº 6.494/1977), que desfaz o vínculo empregatício. Antes da Constituição Federal de 1988 ampliar direitos trabalhistas importantes como a licença-maternidade de 120 dias, a redução da jornada de trabalho para 44 horas semanais, o direito à greve e o seguro desemprego, houve dispositivos legais relacionados ao trabalho rural e ao trabalho doméstico, pelas leis nº 5.859 de 1972 e nº 7.102 de 1983, respectivamente. Além dessa regulamentação ser meramente formal, o Brasil viveu em 1974 um dos principais golpes aos direitos trabalhistas, a Lei da Terceirização (Lei nº 6.019/1974, e suas atualizações) que estabeleceu a permissão de se terceirizar atividades-meio, e depois em 2017 também abrangendo a terceirização para atividades-fim, com a Lei 13.429 de 2017.
Desde então, o estágio da desregulamentação do trabalho no Brasil é devastador. Em 2017, a reforma trabalhista iniciou uma verdadeira demolição dos direitos sociais da classe trabalhadora no Brasil. Acontece que a reforma do trabalho de 2017 não é, nem de longe, a única fonte desses ataques sistemáticos: existe em curso uma intensa destruição por meio de um conjunto de reformas, ataques às instituições públicas que atuam pelo equilíbrio mínimo das relações de trabalho e decisões que destroem os direitos consolidadas e reconhecidos das e dos trabalhadores.
Em 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF), que atua como vanguarda no ataque aos direitos trabalhistas, decidiu que normas de acordos e convenções de trabalho limitem, restrinjam ou afastem direitos trabalhistas, excetuando apenas os direitos indisponíveis previstos na Constituição Federal. Essas decisões não apenas enfraquecem as entidades sindicais como desmobilizam os trabalhadores e reafirmam a crença de que a autonomia das partes nos contratos de trabalho não será prejudicada por meio da relação de dominação entre as classes.
A desregulamentação do trabalho no Brasil é um projeto de desmonte dos direitos trabalhistas que tem como repercussão a própria capacidade e contencioso de organização do proletariado, que acaba por enfraquecer as mobilizações sociais. O Dia Internacional do Trabalhador, comemorado no 1º de Maio, sofre também de uma crônica desmobilização por conta do aumento exponencial da informalidade. Mesmo com a consciência do significado histórico das leis trabalhistas e como elas funcionam para garantia do mínimo, o processo de desregulamentação do trabalho gera uma situação de total submissão de trabalhadoras e trabalhadores às jornadas exaustivas, como os empregos que adotam a escala 6x1, ao risco de desemprego e às condições insalubres de trabalho.
Por jogar grande parte da massa trabalhadora num cenário de desamparo à margem da legislação, as condições de trabalho atualmente demonstram não só o percurso institucional desses ataques, como a necessária consciência e mobilização de um 1º de Maio massivo, para que o proletariado retome às ruas com combatividade e independência política frente à burguesia e seus governos que destroem os direitos dos trabalhadores. Dentre as urgentes demandas, o horizonte de superação da desregulamentação do trabalho, com a revogação das reformas trabalhistas e previdenciárias, e o papel do movimento sindical operário são pontos essenciais para uma agenda desse enfrentamento que deve colocar o Dia Internacional do Trabalhador como a data mais importante do primeiro semestre de 2025.
Além do calendário de lutas pela redução da jornada de trabalho, que se iniciou em 15 de novembro de 2024, no primeiro semestre de 2025 houve uma série de movimentações e paralisações de categorias em busca de melhores condições de trabalho. Os trabalhadores entregadores de aplicativos construíram paralisações em mais de cem cidades nos dias 31 de março de 1° de abril com o Breque dos Apps; os petroleiros se organizaram em paralisações e greves nacionais também nos meses de março e abril; em todo território brasileiro há notícias de servidores públicos, trabalhadores da saúde, da educação, da indústria e do comércio lutando contra patrões e governos.

Trabalhadoras e trabalhadores de aplicativo organizando o Breque dos Apps em Belo Horizonte, no dia 31 de março de 2025. Foto: Jornal O Futuro.
O Dia Internacional do Trabalhador é inseparável da luta da classe trabalhadora pela redução da jornada de trabalho. Com origem no Massacre de Chicago, o primeiro dia de maio inspira manifestações do proletariado desde o final do século XIX. Já em 1898 a redução da jornada era incorporada aos programas das primeiras organizações operárias que se formavam e era tema presente nas principais pautas da imprensa operária. Mesmo depois de mais de um século e com a evolução técnica que impulsionou a produtividade em níveis incomparáveis aos observados no passado, os trabalhadores e trabalhadoras continuam submetidos a jornadas de trabalho semelhantes. Assim, o 1º de Maio deve ser tomado como o que ele é: uma data que representa a capacidade de mobilização e demonstração da força do proletariado que se dispõe a estar em luta nas ruas contra o enriquecimento de bilionários que lucram às custas de suas vidas.