China e EUA anunciam pausa de 90 dias na guerra comercial

Com a anunciada pausa, os EUA reduzirá a tributação sobre produtos chineses de 145% para 30%, mantendo os 20% adicionais relacionados ao fentanil, já a China reduzirá a tributação de 125% para 10%.

14 de Maio de 2025 às 15h00

Reprodução/Foto: Kevin Lamarque/Reuters.

No último dia 12, China e EUA anunciaram uma pausa por 90 dias nas tarifas de importação que os dois países vinham adotando em meio a uma intensa guerra comercial, intensificada no último dia 02 de abril com um anúncio pelo presidente estadunidense Donald Trump de tarifas de importação para diversos países.

As negociações que resultaram na suspensão temporária nas tarifas aconteceram durante o fim de semana entre os dias 10 e 11 de maio em Genebra, na Suíça, onde representantes de ambos os países estavam com esta finalidade. Participaram da reunião o secretário do Tesouro dos EUA Scott Bessent, e do lado da China o vice-primeiro-ministro He Lifeng, principal responsável por assuntos econômicos.

Com a anunciada pausa, os EUA reduzirá a tributação sobre produtos chineses de 145% para 30%, mantendo os 20% adicionais relacionados ao fentanil, já a China reduzirá a tributação de 125% para 10%. Além da tributação, a China também informou que suspenderá restrições à exportação para os EUA das chamadas terras raras – materiais utilizados pela indústria em setores ligados à tecnologia de ponta, a exemplo da fabricação de semicondutores.

Marcando o que pode ser o início de longas negociações entre os dois países, a suspensão das medidas será válida por 90 dias, tempo que poderá servir para estabelecer novos termos de relações comerciais entre ambos. Os efeitos da guerra comercial, e a consequente necessidade de retomada de algum grau de relações entre China e EUA, mostra o estágio de dependência recíproca a que as duas maiores economias chegaram.

Apenas considerando o comércio de mercadorias entre China e EUA, foi movimentado em 2024 uma quantia de cerca de U$ 585 bilhões. Os EUA é um mercado consumidor grande o suficiente para as mercadorias chinesas, enquanto a China movimenta o comércio mundial, com negociações feitas sobretudo em dólar, mantendo fortalecido o poder estadunidense.

As importações feitas pelos EUA com relação à China representam U$ 440 bilhões, enquanto a China importa dos EUA U$ 145 bilhões. Além disso, observa-se como os capitais estadunidenses estão presentes em cadeias produtivas com significativas partes delas localizadas na China. Um exemplo claro é a Apple, que produz algo em torno de 80% de seus produtos no país asiático e, com a ameaça de encarecimento dos produtos devido às tributações alfandegárias, a empresaria seria forçada a transferir suas fábricas para outros locais. O que não seria uma tarefa de curto prazo, já que essas linhas de produção levaram cerca de duas décadas para se instalar.

Antes do acordo do último dia 12, foi noticiado em veículos da grande mídia o risco de recessão. As previsões assumiram um tom apocalíptico, prevendo sobretudo perdas nos mercados de ações, alta na inflação pelo mundo todo, bem como taxas de juros mais altas. No início do ano, as previsões para os juros dos EUA eram de queda, após a escalada das tensões os juros foram mantidos já por três vezes consecutivas e a expectativa é de aumento na taxa de desemprego no país. Notícias também envolveram desde o fechamento de fábricas na China até o desabastecimento em prateleiras nos EUA.

Relembrando os eventos, no início de abril, Donald Trump anunciou tributos alfandegários contra um grande número de países, de forma generalizada e arbitrária, unicamente para pressionar esses países a se submeterem ao seu poder econômico.

Dentre as maiores taxas aplicadas estavam aquelas aos produtos chineses em 34% a mais do que 20% já cobrados antes. A China retaliou a medida, e aplicou também 34% sobre produtos estadunidenses. Após trocas de ameaças e tensionamento, a situação foi escalando e culminou em tarifas de 125% da China sobre importações dos EUA e 145% sobre importações vindas do país asiatico.

Inicialmente, os argumentos para a imposição de taxas tão altas pelos EUA tinha sido a questão do déficit na balança comercial. Ocorre que, ao anunciar as cobranças adicionais, o efeito causado foi exatamente o oposto, e o volume de importações, em comparação com março de 2024, mais que dobrou, saindo de U$ 68,6 bilhões para U$ 140,5 bilhões.

Outro efeito foi percebido em pesquisas de popularidade, que constataram a queda da aprovação de Trump nos primeiros 100 dias de governo, que foi a mais baixa de um presidente estadunidense nos últimos 50 anos. Medidas que geram inflação e perda do poder de compra da classe trabalhadora têm se mostrado problemáticas para a legitimidade dos governos que as adotam.

Tanto a China quanto os EUA se mostram ligados de uma forma inconveniente para ambos, dada a dinâmica de seus capitais. A suspensão dos tributos aponta para a tentativa de mitigar os efeitos mais imediatos da guerra comercial, mas certamente os dois países continuarão a buscar formas de reduzir essa dependência.

Assim, os acordos comerciais com outros países continuarão a ser buscados. Desde o primeiro mandato de Trump, o volume de importações dos EUA vindas da China reduziu de 21% em 2016 para 13% em 2024. A China por sua vez busca ampliar o horizonte de parceiros comerciais, efeito do estado de superprodução a que sua economia chegou, sendo muito dependente da necessidade contínua de exportação de produtos e de capitais.

No Brasil, a mídia tradicional propagandeou largamente que a situação poderia ser uma oportunidade de negócios para a burguesia do país, em particular na exportação de commodities.

Alguns dados indicavam a possibilidade de que setores agroexportadores no Brasil, ligados sobretudo à soja, carne bovina e aves, bem como petróleo, pudessem aproveitar o cenário para fazer negócios com ambos os países em disputa e gerar resultados econômicos positivos.

O problema é que o Brasil enfrenta atualmente um quadro de inflação de alimentos, no qual a destinação da produção para o mercado externo, com a finalidade de aumentar as taxas de lucro da burguesia ligada a essas atividades, possui a tendência de aumentar os preços no mercado interno.

Destaca-se o atraso com que o atual governo petista tem lidado com os estoques reguladores, que poderiam proteger o mercado interno. A política foi desmontada durante o Governo de Jair Bolsonaro, e o PT, apesar das promessas de campanha, até agora atuou de maneira insuficiente, o que teve impactos em sua popularidade.

É o terceiro ano do mandato de Lula e pouco foi feito para garantir preços mais baixos ao consumidor nacional. Recentemente, no início de março deste ano, o governo anunciou medidas para fortalecer os estoques reguladores.

Olhando a que patamares chegaram os preços do ovo e do café, produtos de primeira importância no dia a dia dos brasileiros, verifica-se crescente alta. No caso do ovo especificamente, a alta tem origem na escassez do milho, que é a base da alimentação das aves, associado à uma crise na produção dos EUA que fez parte da produção brasileira ser destinada à exportação, desabastecendo o mercado interno.

Assim, apesar das tratativas iniciadas entre China e EUA, esses países devem continuar tentando diminuir a dependência recíproca, lançando outros países como o Brasil em relações de maior dependência para com ambos, para que setores da burguesia possam se ajustar e aproveitar as possibilidades do processo de reacomodação de blocos de capital.