Entre algoritmos e metas: as lutas dos trabalhadores da tecnologia e das telecomunicações

Por trás dos cabos, telefones, telas e algoritmos que sustentam a economia digital, há uma classe trabalhadora que luta por condições básicas - e começa a se mobilizar de forma mais incisiva.

2 de Novembro de 2025 às 15h00

Por João Oliveira

Num setor que simboliza o “progresso” e a “inovação”, cresce uma realidade menos glamourosa: a das trabalhadoras e dos trabalhadores da tecnologia da informação (TI), das telecomunicações e do telemarketing, que convivem com a precarização, a sobrecarga e a instabilidade. Por trás dos cabos, telefones, telas e algoritmos que sustentam a economia digital, há uma classe trabalhadora que luta por condições básicas - e começa a se mobilizar de forma mais incisiva.

A falsa liberdade das Big Techs

Enquanto empresas de tecnologia promovem discursos sobre flexibilidade e autonomia, o cotidiano de seus trabalhadores e trabalhadoras revela outra face. Desenvolvedores, analistas e técnicos enfrentam longas jornadas, metas inalcançáveis e uma cultura empresarial que valoriza o “engajamento” acima do descanso.

O avanço da terceirização e do trabalho remoto agravou o quadro: vínculos frágeis, pejotização e contratos temporários se tornaram regra. Segundo dados do Sindicato de Profissionais de Tecnologia da Informação de São Paulo, o setor emprega 1,1 milhão de trabalhadoras e trabalhadores no país, sendo 40% deles contratados na modalidade pessoa jurídica (PJ), sem direitos trabalhistas garantidos, como 13º salário, férias, auxílio doença, dentre outros.

Telecomunicações: a espinha dorsal esquecida

No setor de telecomunicações, que mantém a infraestrutura de internet e telefonia do país, as trabalhadoras e os trabalhadores enfrentam riscos físicos e pressões diárias. Instaladores e técnicos de campo denunciam baixos salários e condições precárias de segurança.

A reestruturação do setor, com sucessivas terceirizações e fusões, tem levado a demissões em massa e ao enfraquecimento dos direitos. A luta sindical concentra-se na redução das metas abusivas, na valorização salarial e na defesa de planos de saúde. Vale ressaltar que muitas das empresas do setor de telecomunicações, que negam reajustes salariais e diversos direitos trabalhistas, possuem números crescentes de lucratividade.

A empresa transnacional Claro, com sede no México e atuando no Brasil, apresentou, no segundo trimestre de 2023, aumento da receita operacional líquida de 7,5%, representando um montante de mais de R$11 bilhões. Já a empresa da Espanha, a Vivo, também com atuação no país, obteve um aumento de receita líquida de 7,6%, totalizando quase R$13 bilhões.

Em relação à Tim, da Itália, essa teve um lucro líquido normalizado de  R$638 milhões e crescimento de 9,2% na receita operacional líquida, mostrando que é plenamente possível atender as propostas de melhorias da categoria.

Telemarketing: o laboratório da exploração

O telemarketing, onde atuam majoritariamente mulheres, jovens, negros e LGBTIs, continua sendo um dos espaços de maior precarização. Trabalhadoras e trabalhadores sobrevivem com baixos salários, metas sufocantes e controle permanente - agora reforçado por softwares de vigilância e inteligência artificial.

Nos últimos anos, greves e paralisações em grandes centrais de atendimento, como as da Atento e da Almaviva, têm colocado em pauta a redução da jornada de trabalho, reajustes salariais e o fim do assédio moral como reivindicações centrais.

Em maio deste ano, o Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações da Bahia (Sinttel) realizou uma greve de 24 horas em frente a sede da empresa de telemarketing Contax, em Salvador (BA). A paralisação das trabalhadoras e dos trabalhadores cobrou o cumprimento de direitos trabalhistas que estavam sendo sistematicamente desrespeitados pela empresa.

Organização e resistência

Apesar da dispersão geográfica e do medo de retaliações, cresce o movimento de articulação entre trabalhadoras e trabalhadores desse setor. Associações e sindicatos vêm usando as próprias ferramentas tecnológicas para promover assembleias virtuais, denúncias e campanhas por direitos.

A pauta unificada desse setor inclui a regulamentação do trabalho remoto, o direito à desconexão, a proteção contra demissões arbitrárias, a valorização dos pisos salariais e o reconhecimento da saúde mental como questão trabalhista.

Em um país cada vez mais dependente de redes, dados e serviços digitais, o papel das trabalhadoras e dos trabalhadores da tecnologia e das comunicações é central - mas invisibilizado.