A precarização do trabalhador da saúde como política: por que 7000 vagas temporárias não vão “curar” a Saúde do DF?

Um pedido de emergência por mais de 7000 profissionais temporários não é um plano de recuperação para a Saúde do DF; é a confissão de um colapso estrutural.

3 de Dezembro de 2025 às 21h00

Logomarca SES-DF, 2023.

Por Caio da Silva Barbosa

No dia 25 de novembro de 2025, a sociedade do Distrito Federal foi surpreendida pela divulgação de um documento da Subsecretaria de Gestão de Pessoas da Secretaria de Saúde do Distrito Federal. O texto pedia autorização para um Processo Seletivo Simplificado de emergência, com um pedido extraordinário de mais de 7.000 vagas para contratação temporária e formação de cadastro de reserva. As vagas são destinadas aos cargos de Médicos, Especialistas em Saúde, Técnico e Auxiliar em Saúde.

A justificativa apresentada era para reposição e o complemento urgente da força de trabalho para suprir a falta de servidores. Segundo dados do próprio documento, enquanto a SES/DF conta com 31.962 servidores ativos, a falta de servidores aproximado é de 23 mil profissionais. Ou seja, a rede pública de saúde do DF opera hoje com pouco mais da metade do quadro que necessitaria.

Essa demanda da necessidade de profissionais é reveladora. Ao analisar os cargos com maior demanda, vemos um retrato de uma rede em crise operacional: Auxiliar em Saúde - Farmácia (2.250 vagas); Técnico Administrativo (2.000); Motorista (1.500); Farmacêutico (1.095); e Padioleiro (750). Os cinco cargos mais requisitados são funções de suporte técnico de saúde e operações, evidenciando uma fragilidade estrutural. Demonstrando assim, uma fragilidade da secretaria em realizar suas operações logísticas como garantir que os medicamentos chegam às farmácias; que os pacientes sejam transportados, e que a burocracia interna funcione

Contudo, a emergência não se restringe ao suporte técnico/logístico. A mesma lista escancara uma carência crítica no núcleo assistencial à saúde. Há uma demanda significativa por Médico Generalista (360 vagas), Anestesiologia (240) e Pediatria (200), especialidades básicas para qualquer secretaria de saúde. Paralelamente, a demanda por profissionais de fisioterapia (440 vagas); fonoaudiologia (370 vagas); nutricionistas (190); e psicólogo (310), demonstra que a alta demanda seria mais que o suficiente para um pedido de concurso público para ocupação definitiva dos cargos, e não ao pedido de processo simplificado para cargos temporários que tanto causam  a precarização do trabalhador.

Ademais, ao observar o vácuo entre os últimos concursos de grande porte da secretaria, sendo o último em 2022, e outros em anos com prorrogação mais sem convocação, podemos traçar um paralelo desolador com as nomeações de 2025. Os números não revelam uma tentativa de resolver a falta estrutural de profissionais por meio de concursos públicos robustos, mas sim a crônica dependência de soluções de temporários.

Em 2025, foram nomeados apenas 232 profissionais. Desse total, 228 são médicos, o que representa 98,3% das contratações. Este dado escancara a prioridade da secretaria de saúde do DF. A prioridade absoluta recaiu sobre especialistas como Médico - Cirurgia Geral (30 contratações), Clínica Médica (22), Pediatria (22) e Gastroenterologia (20). Enquanto dezenas de médicos foram chamados, apenas 4 vagas foram para Técnico de Enfermagem e uma para cada: Contador, Cirurgião Dentista e Enfermeiro.

Contudo, essa distribuição apresenta uma contradição gritante com o pleito do pedido de urgência do edital do Processo Seletivo Simplificado, que previa milhares de vagas para outras categorias. Isso evidencia uma desconexão entre o diagnóstico de necessidade e a execução da convocação de profissionais concursados

Observa-se, assim, que a Secretaria de Saúde do DF atravessa um momento crítico de “miopia gerencial”. A insistência em processos seletivos simplificados, em vez de investir em concursos que poderiam restaurar a estabilidade, agrava o problema que se propõe a resolver. Na prática, essa política instaura um ciclo perverso de insegurança e precarização para o trabalhador da saúde pública do DF. A incerteza sobre a renovação do contrato gera ansiedade, inviabiliza o planejamento de vida e coage o profissional a aceitar condições degradantes. E em níveis coletivos traz a perspectiva da uberização do serviço público.

A proposta da secretaria de saúde do DF, dirigida por Juracy Cavalcante, dos processos simplificados de contratação temporária, ao invés de nomeações e pedidos novos de concursos, traz o resultado de gastos públicos duplamente ineficientes. Embora os contratos temporários se apresentem como uma medida de custo imediato mais baixo, eles geram um custo oculto e cíclico devastador. As despesas recorrentes com novos editais, a perda de produtividade durante os vazios deixado pelos profissionais e a constante rotatividade criam um "gotejamento financeiro" permanente. No longo prazo, esse modelo esporádico e caro supera, e muito, o investimento necessário para realizar concursos e manter um quadro estável e valorizado.