Prefeitura de Ricardo Nunes desaloja 35 famílias de ocupação no centro da capital de São Paulo

De acordo com o Censo Demográfico de 2022 divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), São Paulo conta com cerca de 590 mil imóveis particulares vazios, valor quase 20 vezes maior do que o número de indivíduos em situação de rua.

3 de Agosto de 2025 às 0h00

Moradores se mobilizam para ter o direito de voltarem para sua casa pintando um cartaz como forma de protesto. Foto/Reprodução: Tim Schurmann.

A prefeitura de Ricardo Nunes desalojou 35 famílias que ocupavam um espaço no viaduto da Avenida 9 de julho no dia 30 de junho. No começo da semana houve um pequeno incêndio dentro do prédio, que foi apagado pelos moradores. Algum tempo depois chegaram os bombeiros que pediram que moradores saíssem do espaço para inspeção e depois disso, não puderam voltar.

O prédio ocupado é uma das “pernas” do viaduto nove de julho e, segundo o laudo da prefeitura, a interdição se deve a uma “ameaça à integridade física de seus ocupantes, seus vizinhos e seus transeuntes”. O que foi apontado no laudo são questões comuns a muitas ocupações: fios expostos, muitos eletrodomésticos ligados na mesma tomada, gás em lugar que não há circulação de ar. O processo comum seria dar um tempo para os moradores consertarem as irregularidades, que seriam passíveis de serem arrumadas, mas eles não tiveram acesso a esse direito. O detalhe é que as contas de água e luz da ocupação eram pagas pelos próprios moradores e estavam regulares.

As famílias ocupavam a Avenida Nove de Julho, 389, há sete anos, sendo que o espaço anteriormente era do Centro de Desenvolvimento Social e Produtivo (CEDESP). Foi oferecido uma parcela única de R$ 1.000 para os moradores como indenização por terem sofrido o incêndio e mais R$ 400 por mês de auxílio aluguel. Houveram diversas tentativas de diálogo com a Prefeitura, mas esta foi intransigente quanto a saída das famílias. Após muita insistência, as famílias conseguiram entrar para retirar seus pertences e se mudarem, indo em sua maioria para hotéis sociais. A luta dos moradores fez com que o valor subisse para R$ 600, mas ainda não conseguiram receber.

Segundo os moradores, o dinheiro originalmente foi recusado por eles porque sabem que esse valor não paga aluguel nenhum no centro de São Paulo. Depois de uma semana abandonados pela Prefeitura, que sequer mandou banheiros químicos que foram pedidos para a secretaria de direitos humanos, os moradores desistiram de tentar diálogo. A GCM agrediu diversos ocupantes, incluindo crianças, segundo relatos dos moradores, além de serem deixados dormindo debaixo do viaduto em algumas das noites mais frias do ano. Foi pedido uma reavaliação da Defesa Civil para analisar se havia dano estrutural ao edifício que impedisse os moradores de retornarem aos seus lares, porém essa reavaliação não ocorreu. Vale dizer que se houvesse dano estrutural ao prédio, não só as casas teriam que ser desocupadas, mas todo o viaduto e a Avenida Nove de Julho que passa por ela.

A subprefeitura da Sé, onde está localizada a ocupação, tem a maior concentração de pessoas em situação de rua de São Paulo, com 12.851 pessoas. Segundo o último censo, divulgado pela Prefeitura de São Paulo, de 2021, no total há 31,884 pessoas morando na rua, 31% a mais em relação ao censo de 2019.

De acordo com o Censo Demográfico de 2022 divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), São Paulo conta com cerca de 590 mil imóveis particulares vazios, valor quase 20 vezes maior do que o número de indivíduos em situação de rua. Segundo o Art. 5º da Constituição Federal, de 1988, XXIII - a propriedade atenderá a sua função social. Se o imóvel está abandonado devendo IPTU, o Estado pode aplicar o IPTU progressista e até desapropriar segundo a Lei Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001). Desde 2014, a prefeitura só notificou 1.700 imóveis e nenhum foi desapropriado. Enquanto isso, só na Favela do Moinho, mais de 2.500 pessoas foram retiradas das suas casas. Em um único despejo, o Estado tirou mais gente de casa do que notificou ricos em 11 anos.

Os despejos, a população em situação de rua cada vez mais crescente e a especulação imobiliária, são dois lados da mesma moeda, um projeto da burguesia que lucra com a desigualdade e a pobreza de milhares de brasileiros diariamente.