Dinastia Barbalho: O império que transformou a floresta em negócio
Do controle do Estado às obras da COP-30, como a família Barbalho usa obras bilionárias e faz nepotismo.

Da esquerda para a direita Laize Lazera (Esposa de Jader Filho), Jader Filho Barbalho (Ministro das Cidades), Helder Barbalho, Lula, Igor Normando (Prefeito de Belém e primo de Helder), Hanna Ghassan (Vice Governadora) Rui Costa (Ministro da Casa Civil) e Airton Faleiro (Dep. Federal - PT). Reprodução/Foto: Agência Pará.
Por Mattheus Leal
O Pará, um dos estados mais ricos em biodiversidade e recursos naturais do Brasil, é também um dos mais marcados pela desigualdade, pela concentração de poder e pela corrupção estrutural. No centro desse cenário está a família Barbalho, que há quatro décadas controla o estado como um feudo privado, utilizando o aparato público para consolidar seu projeto hegemônico de poder.
Este texto é uma análise crítica e aprofundada sobre como o governador Helder Barbalho (MDB) e seu clã político perpetuam um sistema de dominação baseado em nepotismo, autoritarismo, precarização de serviços públicos e alianças espúrias com o grande capital. Desde a resistência indígena contra a privatização da educação até os impactos da COP-30 em Belém, passando pela teia de cargos públicos ocupados por parentes e aliados, este material expõe as engrenagens de um projeto de poder que transformou o Estado em um instrumento de enriquecimento e perpetuação de privilégios.
A repressão aos movimentos sociais e a luta pela educação indígena
Em janeiro de 2025, indígenas, quilombolas e professores ocuparam a Secretaria de Educação do Pará (SEDUC-PA) em protesto contra a Lei 10.820/2024, sancionada por Helder Barbalho. A legislação extinguia o Sistema Modular de Ensino (SOME) e o Sistema Modular de Ensino Indígena (SOMEI), substituindo aulas presenciais por ensino remoto em comunidades rurais, ribeirinhas e indígenas.
Essa medida, disfarçada de "modernização", na realidade precarizava o acesso à educação em regiões onde a infraestrutura digital é inexistente. Para povos tradicionais, a escola não é apenas um espaço de aprendizado formal, mas um lugar de resistência cultural e territorial. A imposição do ensino remoto violava o direito à educação diferenciada, garantido pela Convenção 169 da OIT e pela Constituição Federal.
Em vez de dialogar, Helder Barbalho optou por:
- Criminalizar o movimento, acusando manifestantes de "vandalismo" e disseminando fake news (o que levou a Defensoria Pública da União a processar o governo);
- Criar um Grupo de Trabalho (GT) excluindo lideranças críticas, privilegiando etnias cooptadas e alinhadas ao governo para simular consenso;
- Usar recursos públicos para transportar indígenas favoráveis em aviões fretados pelo Distrito Sanitário Indígena, enquanto negava diálogo com os ocupantes da SEDUC;
- Repressão policial, com uso de spray de pimenta e corte de energia no local da ocupação.
A estratégia lembra os métodos coloniais de "dividir para conquistar", em que lideranças são cooptadas para enfraquecer a resistência coletiva. Como denunciou Alessandra Korap (Munduruku): "O governador Helder Barbalho visa acabar com povos indígenas de seus territórios para favorecer empresas mineradoras, expandir o mercado de carbono e promover um falso progresso destinado ao imperialismo, utilizando a COP 30 como vitrine."
Após 24 dias de ocupação e uma greve geral dos professores, o governo foi obrigado a recuar. A Lei 10.820 foi revogada pela Assembleia Legislativa em 12 de fevereiro de 2025. A vitória mostrou a força da mobilização popular, mas também expôs o caráter autoritário de Helder Barbalho, que só negociou quando a pressão se tornou insustentável.
O nepotismo Barbalho: O Estado como propriedade familiar
Enquanto indígenas e professores lutavam por direitos básicos, a família Barbalho consolidava seu domínio sobre o Estado. Uma investigação revelou mais de 20 parentes em cargos públicos, muitos sem qualificação, ocupando funções estratégicas:
- Marlina, Lídia, Laércio Jr., Joércio, Malu, Mara Barbalho: Tias e tios de Helder em órgãos de controle (TCE-PA, TCM-PA, DETRAN);
- Daniela Lima Barbalho (esposa de Helder): Conselheira vitalícia no TCE-PA;
- Nay Barbalho (filha de Mara): Vereadora em Belém e secretária municipal;
A lista conta com mais de 20 parentes nomeados através do diário oficial do Estado. Essa rede de um suposto “nepotismo institucionalizado” garante controle sobre orçamentos, licitações e fiscalização, blindando o clã de investigações.
A família não se contenta com o Pará. Jader Barbalho Filho (irmão de Helder) é ministro das Cidades no governo Lula, e o próprio governador é cotado para vice na chapa petista em 2026. A escolha de Belém para a COP-30 não foi acidental: trata-se de um trunfo político para projetar Helder nacionalmente, enquanto seus aliados lucram com obras superfaturadas.
Você pode conferir a lista completa aqui.
A COP-30 e a gentrificação de Belém: Quem realmente se beneficia?
A COP-30, anunciada como a "COP da Floresta", nos modes do capitalismo, deveria ser mais um evento para discutir financiamento climático e sustentabilidade. Helder se aproveitou do mega evento para fazer, um festival de gastos públicos para beneficiar empreiteiras e o mercado imobiliário:
- R$310 milhões na "Nova Doca", um projeto que despeja esgoto na Vila da Barca (maior favela de palafitas da América Latina) enquanto revitaliza áreas nobres como a Avenida Visconde de Souza Franco (onde apartamentos custam R$ 13 milhões);
- R$150 milhões no Parque São Joaquim, com denúncias de trabalho insalubre e contaminação de operários;
- R$15 milhões para a escola de samba Grande Rio (o maior patrocínio da história do Carnaval), enquanto a educação pública sofre cortes.
A Vila da Barca, comunidade ribeirinha com mais de 7 mil habitantes, é tratada como "zona de sacrifício":
- Seu território receberá os rejeitos de esgoto da área nobre da Doca;
- Moradores não foram consultados, violando o princípio da precaução ambiental;
- Enquanto isso, condomínios de luxo avançam sobre áreas verdes, como o Parque da Tamandaré.
Enquanto o governo anuncia "sustentabilidade", suas ações mostram o oposto:
- Desmatamento da APA Metropolitana de Belém para obras viárias;
- Substituição de árvores por "eco-árvores" de plástico (tecnologia importada de Singapura!).
O Pará como espelho da crise brasileira
A história da família Barbalho e seu domínio sobre o Pará não é apenas um caso isolado de corrupção ou má gestão, mas a expressão mais clara de um projeto de poder hegemônico que transformou o Estado em um feudo privado. Desde a resistência indígena contra a precarização da educação até os impactos excludentes da COP-30 em Belém, passando pela teia de nepotismo que asfixia a administração pública, o que vemos é um sistema articulado para perpetuar privilégios, concentrar riqueza e silenciar qualquer voz dissonante.
O governo de Helder Barbalho opera sob uma lógica autoritária, que se revela na criminalização de movimentos sociais, na disseminação de fake news para deslegitimar protestos e na repressão policial contra quem ousa desafiar suas políticas. A ocupação da SEDUC-PA por indígenas e professores, que forçou a revogação da Lei 10.820, mostrou que a resistência organizada pode vencer, mas também expôs a postura truculenta de um governador que só negocia quando a pressão se torna incontrolável. Enquanto isso, sua gestão continua a favorecer interesses empresariais, como o mercado de carbono e a mineração, em detrimento dos direitos territoriais dos povos tradicionais.
O nepotismo escancarado da família Barbalho, com mais de 20 parentes ocupando cargos públicos estratégicos, é a face mais visível de um Estado capturado. Controlar o Tribunal de Contas, secretarias e autarquias não serve apenas para garantir empregos, mas para blindar o clã de investigações e assegurar que contratos públicos sigam beneficiando aliados. Esse esquema não se limita ao Pará: com Jader Barbalho Filho no Ministério das Cidades e Helder cotado para vice na chapa petista em 2026, o projeto é expandir essa máquina para o plano nacional, usando a COP-30 como trampolim político.
E é justamente a COP-30 que escancara a hipocrisia do discurso ambientalista de Helder Barbalho. Enquanto o governo gasta milhões em propaganda e obras faraônicas para projetar Belém como "capital sustentável", a realidade é de racismo ambiental e gentrificação. A Vila da Barca, uma das maiores favelas de palafitas da América Latina, receberá o esgoto da área nobre da Doca, enquanto condomínios de luxo avançam sobre áreas verdes. Operários das obras da conferência trabalham em condições insalubres, expostos a resíduos tóxicos, e feirantes do Ver-o-Peso são removidos à força, sem compensação. Tudo isso revela que a COP-30 não foi pensada para discutir justiça climática, mas para servir como vitrine de um governo que prioriza o marketing e os negócios das elites.
O Pará, portanto, reflete uma crise estrutural do Brasil: a de um sistema político que permite que famílias como os Barbalho tratem o erário como herança, que megaeventos sirvam de desculpa para despejos e superfaturamento, e que a pauta ambiental seja sequestrada por quem, na prática, a viola. Mas a resistência indígena, a greve dos professores e a mobilização das periferias de Belém mostram que há alternativas a esse modelo. O desafio não é apenas derrotar um governador ou um clã, mas destruir o Estado burguês que sempre será refém de interesses privados.