A Reforma Administrativa avança para destruir o Estado brasileiro

Em meio a entrevistas concedidas à grande mídia, o relator do GT da Reforma Administrativa divulga a conta gotas possíveis ataques a direitos e ao próprio Estado.

21 de Setembro de 2025 às 15h00

Reprodução/Foto: Zeca Ribeiro e Marina Ramos/Câmara.

Desde que foi formado o Grupo de Trabalho sob relatoria do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) ainda em maio deste ano, e depois de uma série de anúncios e entrevistas, ainda não se tem acesso a qualquer texto ou documento oficial do que consistirá a proposta de reforma administrativa, porém o relator encarregado dos estudos para sua formulação, adiantou em entrevistas nos últimos dias, algumas medidas que serão propostas.

As pretendidas mudanças devem ocorrer por meio de uma emenda à Constituição, uma Lei Complementar e uma Lei Ordinária. Em resumo o conteúdo do que será proposto inicialmente deve consistir em 70 medidas divididas por quatro eixos principais.

Sob o discurso de tornar a administração mais “eficiente” e na introdução de noções do mercado privado como a ideia de “mérito”, com vistas a precarização das carreiras no serviço público, com retirada de direitos e fragilização dos vínculos. Dentre as medidas, estariam novas regras para ingresso nessas carreiras, como redução de salário nos níveis iniciais, prevendo até 50% da remuneração final para o nível inicial, também regras mais rigorosas para estágio probatório, e a possibilidade de iniciar em níveis mais altos da carreira relativizando a igualdade que deve prevalecer nesse tipo de contratação.

Hoje é comum a contratação em regime temporário para diversas funções, em particular na educação e na saúde. Em tese, esse tipo de contratação se destinaria a situações de emergência e para suprir necessidades excepcionais, mas, na prática, funciona como forma de precarizar como um todo as categorias, já que os servidores contratados nesse formato são mantidos em vínculos precários, sendo desligados ao fim do tempo do contrato, que geralmente é de dois anos e, além disso, não gozam dos mesmos direitos que os servidores de carreira desempenhando as mesmas funções, como regimes de previdência próprio e benefícios ou auxílios que tenham sido conquistados pela categoria ao longo do tempo.

Assim, o que hoje ocorre de forma desordenada e em claro desvio de finalidade, pela reforma administrativa seria definitivamente incorporado ao sistema legal em vez de ser combatido. A ideia defendida é ampliar as hipóteses de contratação temporária no serviço público, bem como estabelecer objetivamente as regras e critérios daquilo que efetivamente já vem sendo feito. Para se ter ideia do que a contratação temporária vem produzindo no quadro do estado brasileiro, a quantidade de professores temporários nas redes estaduais já é maior do que a de efetivos. Segundo pesquisa de 2024, o percentual de profissionais precarizados era de 50,04% contra 49,96%. Falou-se até na previsão de um cadastro de trabalhadores temporários para municípios que tenham dificuldades na realização de seus próprios concursos, com claro sentido de legitimar definitivamente a prática.

Dentre as medidas, estão pontos que levantam opiniões inflamadas na opinião popular como os chamados privilégios de salários acima do teto constitucional, férias de 60 dias para juízes, ou mesmo a chamada aposentadoria compulsória.

Também estão previstas, segundo antecipou Pedro Paulo, a obrigatoriedade de indicação de metas e indicadores para os mandatos. Bem como limites no número de secretários em municípios sem receita própria, que dependem para se financiar dos repasses da União e dos Estados.

Está colocado um cenário de desmonte do Estado brasileiro, do sucateamento iniciado com o golpe em 2016 e que foi se aprofundando durante o governo de Jair Bolsonaro, com cada vez mais poder indo para o Congresso nacional, especialmente a partir de maiores mecanismos de controle do orçamento. Desse modo, dentre as medidas da reforma, itens como a obrigatoriedade de revisão anual de despesas e um sistema para avaliação de políticas públicas, nada mais serão do que novas formas para aumentar os poderes desse mesmo Congresso em relação ao executivo.

Em fala para O Globo, o deputado Pedro Paulo diz que “É para exigir que isso seja feito anualmente, seja para reduzir o déficit primário, por exemplo, seja para realocar a economia daquela despesa que está mal alocada, que está exagerada”.

O orçamento público, desse modo, é tratado exclusivamente pelo ponto de vista do gasto, sempre com foco no “corte”, na “redução”, no “ajuste”. Isso coloca o orçamento sob permanente pressão. Tudo que se tem de informações sobre a proposta de reforma é o que foi deliberadamente informado pelo deputado relator do GT e divulgado na mídia hegemônica. O texto da reforma segue oculto, com a classe trabalhadora sequer sendo escutada durante a elaboração. É uma manobra cada vez mais frequente em se tratando de medidas impopulares, tudo corre por debaixo dos panos até que seja tarde demais.

Sobre essa questão, entidades sindicais, como o SINSEJ, têm denunciado como a proposta tramita sem diálogo com as entidades vinculadas aos trabalhadores. O GT teria até o momento escutado entidades privadas como Instituto Millenium e Fundação Lemann, e mesmo sindicatos patronais como o FecomercioSP.

Do lado do governo, a Ministra do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos tem esboçado uma posição ambígua ao se mostrar contrária ao fim da estabilidade, porém defendendo a ampliação dos regimes de contratação e ampla avaliação de desempenho.

No sentido de proteger o interesse das categorias de trabalhadores e trabalhadoras dos diversos serviços públicos, sindicatos dessas categorias têm tentado mobilizar manifestações, protestos e paralisações. O SINSEJ destacou a necessidade de atuação da CUT no sentido de convocar uma greve geral, sindicatos e entidades dos trabalhadores e trabalhadoras no serviço público de São Paulo realizaram o Seminário Reforma Administrativa: Destruição dos serviços públicos no último dia 17 para discutir a reforma e conscientizar a categoria. Já o SEDUFSM promoveu em uma live atividade de formação para debates acerca dos impactos da reforma na qualidade dos serviços públicos ofertados à população. De forma geral, sindicatos e entidades das diversas categorias de servidores estão se mobilizando para tentar frear tal reforma administrativa feita sem a participação dos trabalhadores e da população.