Ocupação Palestina Teimosa enfrenta ofensiva higienista e criminalização da direção da UECE
A ocupação foi iniciada na terça-feira (9), em resposta à tomada do espaço feita pela direção do campus, reconhecido há anos como área de permanência e organização discente. O inquérito e a ameaça de envio da tropa de choque ocorreram ainda durante a mobilização.

Foto: Jornal O Futuro.
Por Lívia Sofia de Oliveira
Estudantes do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE), em Fortaleza, iniciaram na última terça-feira (9) a ocupação da chamada “sala dos estudantes” após a direção do centro ter decidido transformá-la em uma panificadora sem consulta prévia à comunidade acadêmica, especialmente ao corpo discente. A mobilização reivindica permanência estudantil, segurança e manutenção de um espaço historicamente construído pela comunidade acadêmica.
A administração reagiu com a presença de um perito criminal, ameaças de acionar o Batalhão de Choque da PM e com a instauração de boletim de ocorrência que lista diretamente cerca de quinze estudantes — que receberam, na sexta (12), intimação judicial em suas casas.
A decisão unilateral de transformar a sala dos estudantes em panificadora
A crise começou quando a sala dos estudantes teve seu uso proibido pela direção do campus e passou a receber máquinas destinadas à instalação de um projeto de panificação. O projeto avançou após a aprovação de financiamento por emenda parlamentar do deputado estadual Renato Roseno (PSOL). De acordo com a assessoria do parlamentar, ele não foi sequer informado no processo que o local para a implementação da iniciativa se tratava da sala dos estudantes; o espaço foi apresentado como uma sala desocupada, omitindo, assim, seu uso histórico pela comunidade discente. A sala, criada em 2018, funcionava como ambiente de estudo, convivência, assembleias e atividades culturais. Apesar disso, permaneceu fechada após a pandemia — momento geral de desarticulação do movimento estudantil no país e na própria universidade — e, agora, seria completamente transformada sem passar por discussão com os estudantes.
Segundo os ocupantes, o projeto de panificação é bem-vindo, mas não às custas do principal espaço de permanência do campus. Eles afirmam que nenhuma reunião ou consulta foi realizada pela direção antes do início das alterações.
Mobilização e início da ocupação Palestina Teimosa
As manifestações começaram já no dia 8 de dezembro, quando cartazes e lambes pedindo segurança, combate ao assédio – muito frequente no campus –, rompimento das relações da universidade com Israel e permanência foram retirados imediatamente pela administração do campus Fátima. No dia seguinte, os alunos ocuparam a sala dos estudantes, renomeada como Palestina Teimosa.
A ocupação organiza rodas de leitura, assembleias, aulas abertas com apoio de docentes, atividades culturais e um abaixo-assinado que já reúne centenas de assinaturas, além de doações de estudantes e professores. Representantes da pró-reitoria, diretoria e prefeitura da universidade reuniram-se com os estudantes, que reiteraram a proposta de realocar a panificação para outro espaço. Entretanto, por se manterem aferrados à defesa da sala — posição reforçada em todas as assembleias estudantis, cotidianas desde então —, foram apenas apontados como “birrentos” e “mal-educados” pelas instâncias burocráticas.
Perícia criminal, ameaça de choque e boletim de ocorrência
A repressão aumentou na quinta-feira (11), quando a direção do campus levou um perito criminal para avaliar o local da ocupação. Os estudantes questionaram a presença da perícia, alegando que não havia depredação do patrimônio público e que a tentativa de criminalizar a ocupação por parte da diretoria do campus se contradizia com sua omissão frente aos casos de assédio na universidade, não denunciados pela mesma.
Após os questionamentos, o oficial da perícia afirmou que chamaria o Batalhão de Choque para invadir o campus caso os estudantes não saíssem. Atrelado a isso, foi registrado um boletim de ocorrência que inclui cerca de vinte estudantes por participarem da ocupação. Até o fechamento desta matéria, a última ação persecutória foi o envio de intimações judiciais aos estudantes listados, que as receberam em suas casas na sexta (12).
Os ocupantes denunciam que a reitoria responde com violência institucional enquanto ignora reivindicações básicas de segurança, alimentação, estrutura e combate ao assédio no campus: a administração age de forma seletiva. É lenta e conivente para enfrentar a insegurança, a falta de políticas de acessibilidade e o assédio, mas rápida e violenta para punir e silenciar estudantes em manifestações politicamente legítimas e históricas dentro do movimento estudantil. Esse cenário evidencia a criminalização dos estudantes como expressão da lógica neoliberal presente nas universidades públicas, que reprime a organização estudantil ao mesmo tempo em que negligencia problemas estruturais urgentes denunciados diariamente pelos discentes.
A ocupação teima em continuar, apesar da tentativa de criminalização, com um corpo constante de estudantes que não aceitarão a intimidação, mantendo-se firmes em não arredar o pé até que as ameaças tenham cessado.
A ocupação segue firme
Em momento em que um dos cursos do campus não possui CA ativo, com os diversos problemas estruturais supracitados na universidade em geral e no campus em particular se amontoam sem resposta ou ação da institucionalidade para resolvê-los — este cenário geral de descontentamento fez com que o ataque à sala dos estudantes tenha reacendido a necessidade de luta direta, com cada vez mais ousadia. Não só propiciou a retomada da sala, de quase que intocada, nos últimos anos, a, agora, revitalizada e viva; mas também o próprio espírito de mobilização necessário a qualquer conquista estudantil.
A ocupação Palestina Teimosa permanece ativa e afirma que continuará até que a sala dos estudantes seja garantida como espaço permanente da comunidade acadêmica.