Professores do Recife finalizam greve após ameaças do Governo João Campos (PSB)
Greve dos professores do Recife escancara descaso da gestão João Campos com a educação pública, marcada por salários defasados, precarização estrutural e repressão ao movimento sindical.

Professores se reuniram no Clube Português do Recife. Reprodução/Foto: Filipe Gondim / Divulgação.
Os professores da capital pernambucana, organizados no Sindicato Municipal dos Professores de Ensino da Rede Oficial do Recife (SIMPERE), deflagraram greve no dia 9 de maio após mais de dois meses em campanha salarial. As principais reivindicações da categoria foram o pagamento do piso da salarial, com reajuste de 6,27% definido em Lei Nacional nº 11.738/2008 e pelo Ministério da Educação (MEC), com incorporação do aumento à toda a carreira; melhorias estruturais nas escolas para o atendimento efetivo de crianças com deficiência; o cumprimento da Lei da Aula-Atividade; o acréscimo de carga horária para todos; e uma reestruturação da assistência à saúde dos servidores, que vem sofrendo vários ataques e um movimento de privatização de longa data.
A greve durou pouco mais de uma semana, tendo se encerrado no dia 19, após uma liminar da justiça ter decretado a greve ilegal. A estratégia do SIMPERE para continuar mobilizando os professores foi o movimento de assembleia permanente, que teve uma grande aderência da categoria nos dois turnos.
A prefeitura do Recife, sob o governo de João Campos (PSB), firmou uma posição intransigente e de pouco diálogo em relação às pautas apresentadas pelo SIMPERE e pela categoria. Após várias mesas de negociação, sem que houvesse sequer a presença dos secretários de Educação (houve substituição recente na pasta) e em gesto claro de desrespeito aos trabalhadores, a prefeitura optou por tomar o caminho da intransigência não aceitando o reajuste do piso garantido pela lei federal e ameaçando fechar a negociação das mesas setoriais se a categoria não apresentasse uma contra proposta. As ameaças e represálias também foram direcionadas a professores e a gestores da rede ao longo de todo o movimento. Por fim, a categoria, orientada pelo SIMPERE, decidiu recuar frente à inflexibilidade e ameaças do governo. Dentre o que ficou acordado entre as partes, muito aquém das pautas inicialmente colocadas, o mais importante inclui um ajuste de 3% dividido em 3 parcelas durante o ano, 3,27% em forma de abono (que não incorpora no salário) e o pagamento do salário com a acumulação de professores nesse regime.
No início da greve, em seu discurso oficial, o governo municipal afirmou que estranhava e lamentava a deflagração da greve com as negociações em andamento, que todos os profissionais de educação da rede municipal do Recife recebiam o piso salarial ou acima e ainda que os ganhos salariais dos profissionais nos últimos quatro anos chegaram a percentuais de até 79%. Contudo, logo vê-se que essas alegações são falsas. Após mais de 12 anos de gestão do PSB à frente da administração municipal, sendo os últimos quatro sob o comando do prefeito João Campos, o retrato da educação do Recife é marcado por desvalorização profissional, adoecimento dos trabalhadores, mau uso de recursos públicos e crescente influência do setor privado. A propaganda intensiva veiculada na televisão e na internet projetaram o prefeito como figura de referência na gestão pública, mas a realidade dos trabalhadores da educação demonstra o contrário.
Recursos destinados à educação têm sido utilizados sem planejamento adequado, resultando em aquisições de materiais e contratações de serviços que desconsideram as reais necessidades das escolas. A abertura ao capital privado se evidencia na adoção da política das chamadas “creches parceiras”: instituições privadas que recebem verbas públicas para oferecer serviços de cuidado diário, berçário e educação infantil, frequentemente sem atender a critérios básicos de infraestrutura e qualificação profissional. Além de outros problemas típicos da gestão neoliberal, como a utilização massiva de força de trabalho em contratos precários (sem estabilidade, direito pleno à organização ou sequer equiparação salarial com os profissionais efetivos), demoras para abertura de concursos públicos e nomeação de novos servidores, tudo isso para não mencionar as diversas denúncias envolvendo desvios de recursos públicos e superfaturamentos, agravando ainda mais o cenário de fragilidade e precarização da educação municipal.
Neste cenário, João Campos utiliza os números para maquiar a realidade: os reajustes salariais concedidos nos últimos anos vêm provocando um evidente achatamento da carreira. É verdade que professores recém-nomeados recebem salários equivalentes ao piso nacional – ainda assim inferiores aos de colegas em municípios vizinhos com orçamentos até cinco vezes menores que os da capital. No entanto, esses aumentos não têm sido refletidos na remuneração dos servidores mais antigos, resultando em uma perda salarial de aproximadamente 13% nos anos anteriores. Além disso, os aumentos proporcionados pela prefeitura se mantiveram abaixo do ajuste nacional (em 2022 foram 23% ao invés de 33% e em 2023, de 8% a 10% variando conforme titulação, ao invés dos 14,9%). A maior parte do complemento é paga em forma de abono, verba que não incorpora no salário e pode ser retirada a qualquer momento. Chama atenção, por exemplo, o fato de o prefeito ter concedido neste mesmo ano um reajuste de 30% ao seu secretariado — cerca de seis mil reais a mais no salário – enquanto ofereceu um reajuste menor que o aumento inflacionário à categoria dos professores, apesar de ser amplamente sabido que há espaço no orçamento para atender às demandas apresentadas.
A negativa constante, portanto, parece ser uma escolha essencialmente política. Mesmo escolas que passaram por reformas recentes ainda enfrentam sérios problemas estruturais, como vazamentos, falta de salas adequadas para atividades administrativas, carência de profissionais para acompanhar estudantes com deficiência e casos de alunos que, mesmo em maio, ainda não receberam material escolar e fardamento adequado. Resta, então, a pergunta: qual é o interesse de João Campos em manter os salários dos professores defasados e as escolas em condições tão precárias? Ainda em gesto claro de desrespeito à classe trabalhadora, a prefeitura judicializou a disputa, conseguindo decisão favorável ordenando o fim da greve, no último dia 14, sob ameaça de multa diária no valor de cem mil reais contra o SIMPERE, não sendo a primeira decisão do TJPE no mesmo sentido nos últimos anos.
Apesar dos ataques e da postura intransigente do poder público – que condicionou a retomada das negociações ao encerramento da paralisação –, a categoria seguiu firme durante a greve. Desde o início do ano, o sindicato desempenhou papel central na mobilização: mais de 1.500 profissionais participaram da assembleia que deflagrou o movimento, que permaneceu com mais de 90% de adesão entre os professores, resultando na suspensão das atividades em mais de 400 escolas durante sua vigência. Insatisfeita com as políticas de austeridade da prefeitura, a categoria vem reunindo uma maior disposição para organizar a base, o que se traduz na realização de assembleias, paralisações e debates nas instituições escolares. Todavia, o movimento também é marcado por contradições e limites. Desde 2023, o SIMPERE voltou a ser filiado à CUT – Central Única dos Trabalhadores, entidade intimamente associada ao campo governista e ao PT, que compõe a gestão João Campos.
É fundamental denunciar os impactos da gestão reacionária de João Campos (que já vive em ritmo de campanha para o governo estadual) e seus ataques ao povo trabalhador – não apenas na educação, mas em todas as frentes de atuação do governo.