Como a Meta lucra com anúncios de golpes financeiros

A proliferação de anúncios fraudulentos com uso intensivo de inteligência artificial evidencia como a arquitetura das plataformas digitais, com o objetivo de lucro fácil, maximização de ganhos e disseminação em massa de fake news.

27 de Novembro de 2025 às 21h00

Reprodução/Foto: Adobe Stock.

O Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais (NetLab), vinculado à UERJ, publicou o resultado de uma pesquisa  sobre anúncios maliciosos nas redes sociais da empresa Meta — responsável por Instagram, Facebook e Whatsapp.

O objetivo do estudo foi aprofundar o conhecimento acerca da publicidade enganosa veiculada no ambiente digital, mecanismo por meio do qual inúmeros golpes têm sido aplicados contra os cidadãos brasileiros. Os resultados apontam que as plataformas pertencentes ao grupo Meta vêm sendo percebidas por estelionatários como um terreno fértil para a disseminação de fraudes, uma vez que a combinação entre alto alcance, segmentação precisa e relativa fragilidade nos mecanismos de controle cria condições ideais para a prática desses delitos.

O estudo em questão  envolveu monitoramento constante  entres os dias 10 e 21 do mês de janeiro, período escolhido em razão dos efeitos da trução Normativa nº 2.219/2024, a qual torna obrigatório que instituições financeiras e de pagamento informem à Receita Federal movimentações de R$ 5.000 mensais (ou mais) para pessoas físicas e R$ 15.000 mensais (ou mais) para pessoas jurídicas.

Embora a medida tivesse previsão de vigência apenas a partir de 1º de janeiro de 2025, sua simples divulgação foi suficiente para desencadear uma avalanche de desinformação nas redes, especialmente com a circulação de notícias falsas alegando que transações realizadas via Pix passariam a ser taxadas. Diante do avanço das fake news, da pressão social e do clima de insegurança informacional gerado, o governo federal se viu obrigado a intervir rapidamente, optando por revogar a nova regra no dia 15 de janeiro. Esse cenário evidenciou não apenas a facilidade com que informações distorcidas se propagam nas plataformas digitais, mas também a vulnerabilidade institucional diante da instrumentalização política e econômica das redes sociais pela extrema direita.

De acordo com a pesquisa, a onda de notícias falsas fomentou incertezas na população, criando um ambiente propício para que estelionatários explorassem o momento e intensificassem a aplicação de golpes.

No total, foram identificados 151 anunciantes responsáveis pela veiculação de 1.770 anúncios contendo conteúdo malicioso, além do mapeamento de 87 sites fraudulentos para os quais os usuários eram direcionados após interagir com as peças publicitárias.

Quando anunciou a revogação da Instrução Normativa, o governo federal justificou o recuo afirmando que buscava, entre outros objetivos, conter a propagação de desinformação. Contudo, a análise realizada pelo NetLab demonstra que essa meta não foi alcançada: ao contrário do esperado, o volume de anúncios fraudulentos aumentou significativamente. Nas plataformas da Meta, esses conteúdos registraram um crescimento de 35% após o recuo.

Outro fato de extrema importância ressaltado pelo estudo, se dá ao uso de Deepfakes e IA para capitalização de golpes. As ferramentas foram amplamente empregadas para distorcer ou manipular a imagem do deputado federal Nikolas Ferreira (PL), que se tornou uma figura central na campanha que pressionou pela revogação da Instrução Normativa nº 2.219/2024. A apropriação de sua imagem em conteúdos fraudulentos evidencia como setores lumpens da burguesia financeira agem em conluio de parceria com a popularidade de figuras centrais da extrema-direita brasileira.

O presente cenário demonstra uma consequência da falta de regulação das redes sociais, bem como dinâmicas do capitalismo dependente e financeirizado que marcam o contexto brasileiro. A proliferação de anúncios fraudulentos com uso intensivo de inteligência artificial evidencia como a arquitetura das plataformas digitais, com o objetivo de lucro fácil, maximização de ganhos e disseminação em massa de fake news.

Em economias dependentes como a brasileira, marcadas por maior assimetria tecnológica e regulatória, esses mecanismos tornam a população ainda mais vulnerável à exploração por agentes oportunistas, que se aproveitam tanto das brechas normativas quanto da fragilidade institucional, incluindo a própria colonização dos dados. O fato de tais “golpes” serem viabilizados por empresas sediadas no centro do capitalismo evidencia como o imperialismo em sua fase atual, instrumentaliza as vulnerabilidades jurídicas e econômicas das formações sociais periféricas em prol do lucro.

Assim, a manipulação política e econômica por meio de deepfakes e publicidade enganosa não constitui apenas um problema de segurança digital; revela a incapacidade do mercado de plataformas, orientado por modelos de negócio globais, de garantir padrões mínimos de proteção em países dependentes. Nesse cenário, a regulação das redes sociais deixa de ser uma simples medida administrativa e passa a configurar um imperativo estrutural para mitigar as desigualdades reproduzidas pela dependência tecnológica e pela lógica financeirizada que orienta a atuação dessas empresas.